Dali partimos para um local, uma parcela de terra pequena, em torno de 5 por 8 metros, e Benki indicou inicialmente os locais onde as mudas de coco (num total de três) poderiam ser plantadas. Como fazê-lo? Estava eu interessadíssima no assunto: mais um passo nos meus planos futuros de ter um dia uma propriedade com muitos pés de coco. Pois bem, aprendi que, escolhido o local, uma cova de meio metro de fundura deve ser cavada, sendo seu diâmetro também de 50 centímetros. Feito isso, a cova deve ser toda preenchida com terra estrumada (com cinza, esterco ou outro paú) e o coco plantado sem que seu “cólo” (da onde saem as palhas) seja inteiramente coberto. Última etapa: cobrir a terra em volta do coco com capim para que o sol não judie da muda recém-transplantada ou a chuva não a encharque impiedosamente.
Índios, seringueiros e agricultores moradores da região começam a perceber que novas alternativas precisam ser criadas para a vida na região. Ouvi vários moradores duvidando do gado como uma alternativa realmente vantajosa, embora eles mesmos tenham investido nesta opção. Contudo, observam, os desmatamentos estão excessivos, não dá pra negar, e, afinal, está-se dentro de uma Reserva; os igarapés estão secando, a terra ficando dura como barro; e o rendimento auferido com o gado é no longo prazo e com muito investimento. Estas ponderações, estas dúvidas sobre que caminho seguir, são salutares e também portas de entrada para novas idéias e práticas.
Ver esta conversa acontecer, com seus impasses, diferenças e sinergias é algo que estimula e põe lenha na chama da minha esperança – que anda meio bruxuleante, como se sabe.

Estou agora no Rio de Janeiro. Tirando os efeitos do cansaço da viagem e do fuso horário, percebo-me muito feliz de estar aqui e com um olhar mais atento para as singularidades do lugar. Atento e generoso, pois estou numa fase que acho tudo bom. A cidade é linda, o clima é ótimo, o povo é bacana - minha aldeia é o máximo!
Desde que cheguei, por exemplo, não usei casaco. O clima está ameno, morno, acolhedor. Em Paris e na Holanda conheci pessoas, pessoas de quem gostei muito, e na hora de abraçá-las para me despedir, havia um monte de pano entre nós: casacos. Não conseguia tocar nessas pessoas, ou em algumas delas, sentí-las um pouco mais. O toque, algo aqui relativamente corriqueiro ou que rola com mais facilidade e sem tantos obstáculos. Fiquei com aquela impressão de um relativo desconhecimento em relação a pessoas com quem conversei e convivi um pouco. Frio, casaco, corpo, relacionamentos. Por outro lado, quem sabe (quem sabe?), o frio e os casacos tragam para as relações um componente de recato e mistério, de intimidade conquistada. Ou de obstáculos e distanciamento. Fiquei lembrando do Mauss, das técnicas corporais e dos esquimós também.
Como parte das despedidas, fui a Chartres, há menos de uma hora de Paris. Tive a grata surpresa de fazer este programa com o Fabio Bruno, amigo antigo, de longa data, que chegou para uma breve temporada aqui na Europa. Já vinhamos combinando este passeio conjunto pela internet, e ontem, ao meio-dia, nos encontramos na Gare Montparnasse. Às 14 hs já estávamos em Chartres. Chovia e fazia frio - ah, este verão...
Depois, como era de se esperar, o sol apareceu, mais no final da tarde; a noite estava estrelada, e um vento frio nos mandou pra cama cedo. Antes, porém, vimos o festival de iluminação que nesta época Chartres promove. Há vários monumentos lá, entre eles a Catedral, famosa por sua antiguidade (por volta de 1 mil anos), tamanho gigantesco e vitrais (em especial o tom azulado das vestes de uma representação de Nossa Senhora). De fato, é magistral, mas seu interior um pouco escuro demais, pareceu-me. Uns vitrais estavam em restauração, e outros precisando de uma faxina daquelas, com muita água e sabão. O problema, ou um deles, é que os vitrais são incrivelmente altos. Não dá nem pra imaginar como era uma obra destas naqueles tempos de outrora. É tudo feito em pedra, deviam utilizar andaimes; como será que era a segurança? Qual era, literalmente, o cristão, que subia nesses andaimes?
Depois dos últimos e sempre bem-vindos comentários do Amilton fiquei me sentindo meio "Polyana da floresta". O Mestre Jesus falava da inocência das crianças; por vezes, sem um olhar inocente, tanta coisa fica de fora. Sei lá. Também não sei como ganhar esta guerra, talvez tenhamos mesmo é que purgar muita coisa nesta nossa amada Terra, tão generosa conosco, quase se oferecendo em sacrifício. Devemos, no mínimo, fazer por merecer.
