sexta-feira, 21 de setembro de 2012

GUARANI E KAIOWÁ E A UNIVERSIDADE PÚBLICA

NOTA PÚBLICA FESTIVAL DE INVERNO/UFMG EM APOIO GUARANI E KAIOWÁ-MS

A UNIVERSIDADE E O GENOCÍDIO DOS POVOS GUARANI E KAIOWÁ NO MATO GROSSO DO SUL

Em maio de 2012 o professor César Guimarães, ao caracterizar a noção de "Bem Comum", em torno da qual propunha construir a 44ª edição do Festival de Inverno da UFMG, ofereceu-nos a seguinte reflexão:

Faz pouco tempo, o crítico e curador Simon Sheikh reivindicou que as exposições de arte, tão obedientes à agenda neoliberal, não fossem apenas propriedade do capital, mas também espaços de invenção de novos horizontes de mundo, guiados pelos potenciais de emancipação e esperança das lutas sociais. Longe, muito longe dos espetáculos em que se transformaram as grandes exposições de arte, incluímos no 44º Festival de Inverno da UFMG a participação dos Guarani-Kaiowá, do Mato Grosso do Sul. Submetidos à violência e à pressão econômica exercida pelo agronegócio na região em que vivem, munidos somente do seu maracá e dos cantos, os índios enfrentam o coração endurecido dos brancos, rezando para que a terra floresça e as crianças proliferem (tal como se expressa um dos xamãs no documentário Mbaraká: A palavra que age). (...) No Brasil de hoje, os índios, os habitantes de comunidades quilombolas, ribeirinhas ou extrativistas são os que mais corajosamente se opõem à dilapidação sistemática da propriedade coletiva (conduzida tanto pelas empresas particulares quanto pelo Estado). Em seu anonimato, vivendo em condições adversas, são eles que fazem valer concretamente, em sua existência cotidiana, o slogan do Ministério da Cultura: "Patrimônio imaterial, bem do Brasil".

De fato, em julho de 2012os coordenadores do Festival de Inverno da UFMG recusaram ativamente os espaços e formatos guiados pela lógica da espetacularização,que despotencializamo que professores, artistas, mestres das culturas tradicionais e intelectuais brasileiros têm a fazer e a dizer
quando estão juntos. O festival foi experimentado à maneira de um ritual no qual os sentidos elaborados, tornados expressões,são intensificados e compartilhados. Foram proferidos cantos e histórias em várias línguas faladas cotidianamente no Brasil, e inúmeros participantes descobriram,
maravilhados, a possibilidade de multiplicar as janelas do conhecimento e as formas de viver.

Durante o encontro com nossos convidados Mbya Guarani do Paraná e Rio Grande do Sul e Guarani Kaiowá do Mato Grosso do Sul, fomos arrebatados por seus cantos, pela sua rigorosa forma de expressão, pelas suas "belas palavras", pela generosidade com a qual nos transmitiram conhecimentos
sobre a cura e o uso da terra, das águas, das plantas e do céu. Aprendemos um pouco mais sobre a longa e rica história dos povos Guarani por todo o território brasileiro, cujas marcas ficaram perenes nos nomes dos rios, das montanhas, das cidades e ruas, dos alimentos, dos peixes e de outros tantas
espécies de animais e plantas, nomes que cotidianamente pronunciamos. Mas para além do arrebatamento, ficamos estarrecidos, silenciados, indignados ao tomar conhecimento do que se passa hoje em Mato Grosso do Sul.

Nossos convidados relataram o trabalho degradante, e muitas vezes escravo, a que são submetidos homens e mulheres –jovens e crianças –nos campos de cana de açúcar para a produção do etanol, hoje chamado pelos seus produtores de "energia limpa". Ouvimos o relato sobre as prisões de mais de 200 jovens guarani que, por vezes, sequer sabem o que fazem por lá ou compreendem a língua portuguesa. Ouvimos com preocupação seus relatos sobre a degradação ambiental que transforma o estado do Mato Grosso do Sul em um extenso campo de soja e cana de açúcar, poluindo os rios com agrotóxicos. Nossos convidados relataram o assassinato de seus avós, pais, amigos, grandes intelectuais da civilização guarani. Desde meados dos anos 70, quando centenas de famílias guarani e kaiowá foram expulsas de suas terras e confinadas em reservas na região sul de MS, próximas a cidades como Dourados, Caarapó e Amambai, muitos indígenas se revoltaram contra essa imposição e resolveram retomar seus tekoha – "o lugar onde se pode viver do nosso modo", ou terras sagradas – mais de 250 sábios, lideranças, mulheres e crianças foram assassinados impunemente, além de terem ocorrido mais outras 200 tentativas de assassinato.

Lamentamos o triste relato da epidemia de suicídio entre os jovens guarani, muitos deles entre 12 e 16 anos, com números de mortes comparáveis às maiores taxas do mundo nos últimos anos. Escutamos o que nos disseram sobre a falta criminosa de atendimento médico ou os frequentes atropelamentos dos guaranis nas beiras de estradas. Todos esses relatos mostram, de maneira estarrecedora, como estes nossos pares intelectuais, defensores incansáveis de um tão rico patrimônio ambiental, humano e cultural, são tratados de modo desumano e devastador.

Como professores universitários, pensadores, artistas, denunciamos o modelo de conhecimento que hoje ampara os expropriadores de terras e que faz com que a região do país como maior índice de desenvolvimento econômico seja também o lugar onde se pratica, aberta e impunemente, o genocídio contra uma população indígena, coisa extremamente vergonhosa para a história do Brasil. Esse modelo de conhecimento está destruindo centenas de formas de vida de uma das mais belas regiões do Brasil.

Coordenadores, artistas e especialistas convidados do 44º Festival de Inverno da UFMG – Diamantina/2012

domingo, 17 de junho de 2012

Afinal, um esclarecimento!

Hoje, no blog do Altino Machado, li com um aperto no coração, mas também com certo alívio, uma entrevista (que reproduzo abaixo) com meu caro amigo e profissional engajado Oswaldo Sevá sobre o significado da prospecção de petróleo nas florestas acrianas do ponto de vista do bem-estar dos seus moradores, sejam eles humanos, animais ou vegetais.

Todo o processo prospecção de petróleo, desde seu anúncio - não me recordo exatamente quando, mas lembro do então senador Tião Vianna (PT-AC) revelando uma articulação que já tinha pelo menos 4 anos de vida, pelo visto na surdina - tem sido saudado, com raras e honrosas exceções, como uma benesse; a imprensa local e a agência de notícias do Acre não se cansam de dizer o quanto a iniciativa é positiva e estaria cumprindo todos os procedimentos legais necessários. Os recursos econômicos (financeiros, na verdade) que o petróleo e o gás, se explorados, trarão para o estado são enaltecidos, e royalties a serem pagos às populações locais (indígenas em particular) cumpririam o papel de mitigar e compensar as mudanças de vida que certamente se farão sentir - e no caso dos índios o contexto mais geral é o da discussão sobre mineração em Terras Indígenas, agora a todo vapor no Congresso Nacional (nacional?).

Indiscriminadamente (intencionalmente?), reuniões de esclarecimento técnico por parte da Georadar, empresa que ganhou a licitação para a prospecção sísmica, são confundidas com "audiência" ou "consulta" públicas; há uma empolgação local diante de promessas de empregos e progresso; o complexo de isolamento e atraso, que parece assolar as cidades localizadas dentro ou nas margens da floresta, vem à tona com força; a idéia de que nosso desenvolvimento poderia seguir outros rumos a partir do nosso diversificado patrimônio natural e cultural (material e cosmologicamente falando) cai por terra diante da força avassaladora do "desenvolvimento econômico", da ganância de alguns e da estreiteza de pensamento de outros tantos; sem um movimento de oposição que reúna os povos da floresta, as iniciativas de resistência são, por um lado, taxadas de irresponsáveis e não representativas do conjunto (como de fato não poderiam ser), por outro lado, acabam entrando num jogo político cheio de faccionalismos.

E aí vem a entrevista com o Sevá nos lembrar sobre o que está por vir, ou mesmo já está por aqui. Originalmente feita para um jornal local, ela nunca foi publicada, e agora pode ser lida no blog do Altino, ou aqui, logo abaixo. Boa leitura. Lavou-me a alma, encardida de tanta conversa mole que ando ouvindo, ou esmaecida das conversas qualificadas que não se fazem ouvir.

*  *  *

REPÓRTER - Estou com uma pauta sobre a autorização dada pelo Ibama para que a ANP promova a terceira fase de estudos sísmicos para avaliar a possibilidade de explorar a retirada de gás natural e petróleo em nosso Estado. Gostaria de saber se o senhor, como um especialista no assunto que é, conforme fui informado pelo coordenador regional do Conselho Indigenista Missionário Regional Amazônia Ocidental, Lindomar Padilha, poderia opinar sobre o assunto, o que pensa sobre essa exploração na região amazônica, relatasse sua visão sobre essa intenção, que é baseada em um projeto elaborado em meados da década de 70.

OSWALDO SEVÁ - Não me considero especialista em prospecção sísmica. Mesmo assim é possível comentar a situação. Sou engenheiro mecânico, com um doutorado em Geografia, trabalhei durante 20 anos na área de Energia da Unicamp e atualmente prossigo com os mesmos temas nas Ciências Sociais - onde o meu foco principal é a situação dos grupos humanos atingidos e a Natureza prejudicada pelas atividades industriais, mineradoras e de produção de combustíveis e de eletricidade. Desse ponto de vista, é lamentável que toda a Amazônia, incluindo os territórios de países vizinhos, esteja no alvo da indústria petrolífera internacional, que sabidamente é poderosa, anti-democrática, envolvida em guerras e em atividades repressivas em vários países e cujos gerentes e engenheiros costumam cometer desmandos e atrocidades lá onde a indústria decide funcionar. Porque são funcionários a serviço de uma máquina que desconhece limites e que irá até as últimas consequências para saber onde tem e onde não tem petróleo, e, ao encontrar reservas com potencial lucrativo, vai explorá-las intensamente e sem qualquer preocupação séria com os moradores e com a Natureza.

Pela experiência que o senhor tem, qual a probabilidade de dar certo uma exploração desse porte na região?

Dar certo quer dizer encontrar petróleo e/ou gás natural em quantidade considerada atraente para a indústria? Se for isso, eu não saberia dizer, pois essa resposta necessita de informações técnicas e geológicas acumuladas e detalhadas, que, no momento, quase ninguém tem acesso. Sabe-se que na região produtora entre os rios Urucu e Tefé tem muito gás, e que o petróleo, que é retirado desde 1986, está se acabando; sabe-se que no Baixo Vale do Juruá, na região de Carauari, tem muito gás e já está sendo preparada uma exploração comercial ligando com o gasoduto de Urucu a Manaus. Além disso, quem afirmar que no Sul do Amazonas ou no Acre "será encontrado petróleo" está chutando, e, pior, está querendo que isso aconteça porque vislumbra alguma possibilidade de tirar proveito disso.

Poderia indicar os prós e os contras de se executar um trabalho como esse em uma área que em sua maior parte é composta por terras indígenas e de preservação ambiental? Quais os principais impactos seriam sentidos de imediato?

Essas atividades vão atrapalhar, incomodar, e até infernizar a vida de muita gente na região. Os levantamentos sísmicos significam que a poderosa indústria petrolífera foi autorizada a desembarcar com seus homens e equipamentos e que ali vai ficar por vários anos, tentando controlar tudo e mandar na vida das pessoas. A mata será rasgada para campos de pouso, estradas e trilhas; os sobrevôos, a circulação dos barcos e veículos, os testes com bombas enterradas tudo isso vai afugentar a caça, prejudicar as roças e a pesca; a movimentação de pessoas estranhas na área vai gerar, como sempre, conflitos, aumento do alcoolismo, das drogas, da prostituição. Se for preciso alterar a legislação, a indústria conseguirá, para ser autorizada a prospecção em Unidades de Conservação de Proteção Integral, como são os Parques Nacionais, Reservas Biológicas e Estações Ecológicas. Essas áreas estarão condenadas a nunca mais serem de fato protegidas. Nas terras indígenas também são proibidas por enquanto as atividades, mas vão forçar para fazer, lá dentro ou na faixa vizinha, "do lado de fora"; para os nativos, vão ficar prometendo dinheiro, recompensas, serviços, mercadorias, e até "trabalho" para eles, e "comissões" para a Funai. Não tem retorno.

A experiência executada em Coari, no Amazonas, em moldes parecidos, foi positiva ou negativa? O que se pôde tirar de lição daquele trabalho? O senhor produziu um livro sobre o tema?

Visitei uma única vez por poucas horas a base produtora de Urucu, sobrevoei o primeiro trecho do gasoduto e pousei duas vezes no aeroporto de Coari. Não estou em condições de fazer esse balanço de prós e contras. Não escrevi um livro, nem poderia, mas fiz uma serie de três artigos longos, publicados na coluna do meu compadre Txai Terri Aquino em um jornal de Rio Branco, em 2007, um deles em co-autoria com o antropologo Marcelo Iglesias.

quarta-feira, 16 de maio de 2012

O espírito da floresta em Paris


Desde ontem, dia 15 de maio, até 21 de outubro deste ano, a floresta baixou na Fundação Cartier, em Paris. Pois é, trata-se da exposição Histoires de voir: Histórias de se ver, com obras e narrativas de mais de 40 pintores, escultores e cineastas de países como o Brasil, Índia, Congo, Haiti, México, Dinamarca, Japão e EUA. Não são artistas renomados no mundo das artes plásticas. Como diz o curador da exposição: trata-se de pessoas para quem a arte "tem laços estreitos com a hipersensibilidade do coração", e cujos trabalhos são "documentos vivos". 

O mais bacana de tudo é que temos amigos expondo lá: o grupo de desenhistas da  Terra Indígena do Rio Jordão, que traduzem em imagens suas mirações sob a força e o canto ayahuasqueiros. 

Na verdade, ano passado, a exposição "O espírito da floresta" teve sua primeira vernissage aqui em Rio Branco, e quem viu, viu, quem não viu... se socorra do blog do projeto

Estão lá em Paris, participando dos eventos em torno da exposição o Ibã e o Amilton Pelegrino de Mattos, os dois parceiros que idealizaram o projeto, e seguem tocando e desdobrando esta fértil parceria. Longa vida a ela! E os dois, não satisfeitos com o mundo das artes, aceitaram o convite da profa. Véronique Boyer e foram palestrar para a intelectualidade francesa no Centro de Pesquisa Sobre os Mundos Americanos. Tanto o Amilton como a Véronique são parte da equipe do nosso Laboratório de Antropologia e Florestas (Aflora), aqui na UFAC, e o Ibã bem pode ser considerado um membro honorário! Estamos bem honrados com tudo isso.




Viva o povo Huni Kuin! Viva o Jordão! Viva a ayahuasca! E viva a Rainha da Floresta!

terça-feira, 8 de maio de 2012

Carta Declaratória sobre a Prospecção e Exploração de Petróleo e Gás no Juruá


Reunidos na cidade de Cruzeiro do Sul durante o Seminário “Petróleo, Gás e Ferrovia no Juruá: Desafios e Oportunidades para as Comunidades”, no dia 14 de abril de 2012, nós, representantes de 09 povos, 12 Terras Indígenas e 04 associações indígenas, por intermédio desta carta, apresentamos alguns pontos que entendemos são de extrema urgência e de importância para serem considerados e tratados pela Presidente da República, a Agência Nacional de Petróleo, o Governo do Estado do Acre e demais instituições envolvidas.
É de nosso conhecimento que as atividades de prospecção de petróleo e gás estão ocorrendo na região do Juruá, especificamente nos Municípios de Cruzeiro do Sul, Mâncio Lima, Rodrigues Alves, Porto Walter e Marechal Taumaturgo, sem os informes e os esclarecimentos necessários para salvaguarda da população e do meio ambiente da região, caso venha acontecer algum prejuízo.
Nós percebemos que até o momento vem acontecendo reuniões e encontros políticos que tratam sobre esses grandes projetos de desenvolvimento. Não foram consideradas, contudo, as reuniões de informação e de consulta com a população da região, que seriam de extrema importância para discutir os riscos e benefícios de forma bem transparente.
De acordo com o mapa de linhas sísmicas da empresa Georadar, a atividade chegará próxima às Terras Indígenas Campinas-Katukina, Poyanawa, Jaminawa do Igarapé Preto e Arara do Igarapé Humaitá, além do Parque Nacional da Serra do Divisor, podendo ocasionar impactos ambientais, sociais e culturais, diretos e indiretos, nos territórios, nas populações indígenas e populações tradicionais.
Cientes dos direitos aos nossos territórios e a processos de  Consulta Livre, Previa e Informada, com base no Artigo 231 da Constituição Federal: “São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar seus bens”, e no seu inciso 3: “O aproveitamento dos recursos hídricos, incluídos os potenciais energéticos, a pesquisa e a lavra das riquezas minerais em terras indígenas só podem ser efetivadas com autorização do Congresso Nacional, e ouvidas às comunidades.”, nós, lideranças presentes no seminário acima citado, consideramos alguns pontos que podem afetar diretamente os territórios das populações tradicionais da região:
·         Se confirmada a existência de petróleo e gás na terceira fase da prospecção, a do levantamento sísmico, na próxima etapa de exploração podem ocorrer impactos em nossas comunidades e territórios, situação que nos preocupa muito, por que vem contrariar a gestão territorial e ambiental nas terras indígenas e as recomendações do Zoneamento Ecológico Econômico do Estado do Acre;
·         Este processo reforça as ameaças aos direitos indígenas e reforça um modelo de desenvolvimento que ameaça a cultura dos povos indígenas, como por exemplo, a criação de dependência das comunidades a novas necessidades.
·         Durante 10 meses, a empresa Georadar vai contratar cerca de 400 pessoas da região para trabalhar como mão de obra nas picadas. Esta quantidade de pessoas vai ficar acampada, tendo que abrir clareiras e picadas, criando impactos muito grandes sobre os animais que constitui a principal alimentação dos moradores da floresta. Esses trabalhadores vão criar uma grande movimentação fluvial e terrestre, que pode ocasionar poluição dos rios, afetando a saúde da população local. Estamos preocupados, ainda, com os impactos sociais que a presença dessa quantidade de homens pode causar nas comunidades e mesmo nas cidades onde funcionarão os acampamentos.
·         Temos o direito de sermos informados sobre os locais onde estão ocorrendo às atividades de prospecção de petróleo e gás e, também, devemos saber como estes processos estarão sendo feitos. Uma política de informação deve ser desenvolvida nas comunidades da região, para alertá-las dos trabalhos que serão realizados e dos riscos que estes envolvem.
·         Não precisamos de assistencialismo, mas queremos benefícios, através de projetos de saúde de qualidade, de educação, de produção sustentável e do fortalecimento da nossa organização social e cultural nas nossas terras e de nossas organizações de representação.
·         Para além das medidas já previstas no Plano de Controle Ambiental e na licença concedida pelo IBAMA, temos direito, como parte de um processo de consulta livre, prévia e informada, de debater as formas de compensação e repartição de benefícios dos empreendimentos ligados ao desenvolvimento regional.
·         Requeremos que os órgãos ambientais (IBAMA, ICMBio, SEMA e IMAC) e os Ministérios Públicos Federal e Estadual façam respeitar a legislação e as salvaguardas ambientais relativas à prospecção e à exploração de petróleo e gás, socializando e divulgando os relatórios relativos às fiscalizações e ao cumprimento dos condicionantes do licenciamento.
·          Rejeitamos possíveis mudanças na legislação, na regulamentação da lei de mineração no Congresso Nacional, que vise abrir as terras indígenas à prospecção e à exploração de petróleo e gás, por que vai contra os direitos indígenas, consagrados na Constituição Federal e nas convenções internacionais (Convenção 169 da OIT e Declaração dos Direitos Indígenas da ONU).

Cruzeiro do Sul – Acre, 14 de Abril de 2012

Assinam esta carta
Organização dos Professores indígenas do Acre (OPIAC)
Associação Apiwtxa do Rio Amônea
Associação do Povo Arara do Igarapé Humaitá – APAIH
Associação do Povo Indígena Nukini da Republica – AIN
E representantes das Terras Indígenas
Nukini
Kaxinawá do Rio Jordão
Campinas/Katukina
Kaxinawá da Praia do Carapanã
Rio Gregório
Kaxinawá/Ashaninka do rio Breu
Cabeceira do Rio Acre
      Arara do Igarapé Humaitá

sábado, 21 de abril de 2012

Novo email de N'avi

Dando continuidade aos relatos de primeira mão de nosso amigo-nativo, que protegerei aqui sob o pseudônimo de N´avi, chegou-me hoje as mãos um novo email dele, contando sobre um levantamento realizado pela GEORADAR em 2011 e do qual tomou parte como mateiro. Novamente, como no primeiro relato, "traduzo" o texto logo após o original, com algumas dificuldades, como ficará visível na leitura.

É também visível a preocupação de N'avi com o que pode acontecer com a mata e todos os seres que nela vivem. A empresa aparece citada, claro, e o IBAMA também, como ausente, ou omisso.

esta empresa,mim proucurou, para faze um alevotamento,para ele mais , como mateiro,ela para dentefica,árvore, e todo que fica no solo, eu fui mais tanto que eu fis e falei para o IBAMA, que para esta empresa,começa, seus trabalho, é eu falei, todo que eu vim é que porderia, acom tesse sifosem, vedade mesmo mais aminha esperança ela que estor, não acotecesim, mais, mesmo assim esta com ano que eles mim proucuram,mais o trabalho,que eu fis com eles, o IBAMA não deu,aminima teção é final, mente , ela já comesou, o trabalho, quando, eles mim proucuram, fis questão dii ,com eles mais não a diantou, nada, oslugare,que eu fui  que estava no mapiamento,deles todo ponto do GPS ficou peto da bela dos Rios é igarapés,é também, muito Rasto de caça como porco é veado todo outro,animais, eu coloquei no Relatório que eu fis para eles,mais mesmo asim, não adiantou,na da, estou, preucupado, agora, o que pode a contesse, com noça mata, eu não tenho solução, porque nosso governo,não dar valu vida nem de jente é nem ,dos animais, abraço do amigo

Esta empresa [a GEORADAR] me procurou para fazer um levantamento para ela, mas como mateiro, era para identificar árvores e tudo que fica no solo. Eu fui mas tanto que eu fiz e falei para o IBAMA que para esta empresa começar seus trabalhos, e eu falei tudo que eu vi e que poderia acontecer se fosse verdade mesmo, mas minha esperança era que isto não acontecesse. Mas mesmo assim está com um ano que eles me procuraram mas o trabalho que eu fiz com eles o IBAMA não deu a mínima atenção, e finalmente ela já começou o trabalho. Quando eles [da GEORADAR] me procuraram fiz questão de ir com eles [ir no IBAMA], mas não adiantou nada. Os lugares que eu fui, que estavam no mapeamento deles, todo ponto de GPS ficou perto da beira dos rios e igarapés, e também muito rastro de caça como porco e veado e todo outro animal. Eu coloquei no relatório que eu fiz para eles, mas mesmo assim não adiantou nada. Estou preocupado agora com o que pode acontecer com nossa mata. Eu não tenho solução porque nosso governo não dã valor a vida nem de gente e nem dos animais. Abraço do amigo

Imperdível, aqui em Rio Branco!


Pessoal, taí o convite do lançamento do livro do Terri, "Papol de Índio", o primeiro de uma imensa copilação de escritos que contam, de uma certa perspectiva, digo, de uma fascinante perspectiva, a história do Acre nas últimas décadas. Vale ir, vale adquirir e vale ler. A noite vai ser boa, com música e muita gente bacana pra conversar - não perca!

terça-feira, 17 de abril de 2012

Em busca do petróleo na floresta: começou a corrida!

Reproduzo abaixo email recebido hoje de um amigo seringueiro e pesquisador da floresta (de quem omito o nome para preservá-lo de alguma forma de eventuais perseguições e preconceitos) sobre o início das explosões sísmicas no Alto Juruá em busca de petróleo e gás.

Para entender o que vem a seguir, melhor ler em voz alta. Para os que tiverem mais dificuldade com a língua nativa, "traduzo" (com todas as dificuldades que isso implica) na sequência o texto:

para todo amigo em cruzeiro do sul  comesa, o trabalho de uma impresa,GEORADAR, pegando, de porto walte,a é pichuna,combrido , todas esta  área de que fica neste tragetos,´ja foi pegado, muito, trabalhador,foi mandado para mata, é até, a gora niguei, do meio abente si manifestou, o projeta da, NP confideração,nacional do pretório vão sai destro da mata fazendo,estrada como picada, é fazendor glande, buraco na mata para desse ,éli-copio,é também, fazendo ,buraco no chão, de 4 metro,de fudura,para coloca esprosivio, depos vem uma é quipim,esprudindo,todo eu estou achando, amigo que vai morre, muito animal, é muito peixe também, pode traze para o acre muita doencia como cáncio é outra coisa também, todo atrais de pretrolho, ou mais dinheiro, para o Governo,eu estou, pessado o que pode acontesse, com muito ,pessoa ,que maro dentro da floresta,a braço para todos amigo

"Para todos amigos, em Cruzeiro do Sul começa o trabalho de uma empresa, GEORADAR, pegando de Porto Walter até Ipixuna, cobrindo toda esta área que fica neste trajeto. Já foi pego muito trabalhador, foi mandado pra mata, e até agora ninguém do meio ambiente se manifestou. O projeto da ANP, confederação [na verdade Agência] nacional do petróleo vai sair dentro da mata fazendo estrada como picada e fazendo grande buraco na mata para descer helicóptero, e também fazendo buraco no chão de 4 metros de fundura para colocar explosivo, depois vem uma equipe explodindo tudo. Eu estou achando, amigo, que vai morrer muito animal e muito peixe também, pode trazer para o Acre muita doença como cancêr e outra coisa também, tudo atrás de petróleo ou mais dinheiro para o Governo. Eu estou pensando o que pode acontecer com muitas pessoas que moram dentro da floresta. Abraço para todos amigos."

terça-feira, 20 de março de 2012

quarta-feira, 7 de março de 2012

Resex Alto Juruá: madeira, gado e vila




Marechal Thaumaturgo, Acre, Brasil, 29 de fevereiro de 2012

Aos responsáveis pelos seguintes orgãos e demais interessados:

ICMBio
ASAREAJ
Polícia Federal
Prefeitura de Marechal Thaumaturgo
Polícia Civil

Quero aqui denunciar uma situação que está ocorrendo em nossa comunidade da vila Restauração, alto rio Tejo, Reserva Extrativista do Alto Juruá. Precisamos de apoio para encontrar urgentemente uma solução.

O que me motivou a escrever esta carta é uma grande retirada de madeiras de lei agora acontecendo em vários pontos aqui na região (Boa Vista, boca do Manteiga, Cachoeira do Jarana e Restauração) – estima-se em 250 dúzias de tábuas, além da madeira quadrada. Esta retirada está sendo promovida por um morador novato aqui na Reserva, pois chegou aqui por volta de 2005. Trata-se do sr. José dos Santos Farias, conhecido como José Ripardo.

Este sr., desde que aqui chegou, abriu uma área de pastagem muito acima do limite permitido pelo Plano de Utilização (que é de 15 ha, incluindo casa, terreiro, roçados e área de criação), onde colocou em torno de 60 cabeças de gado. Desde 2010, ele já vem sendo advertido pelo ICMBio, que proibiu novas derrubadas. Em novembro de 2011, numa reunião com representantes do ICMBio de Cruzeiro do Sul (Urbano Lopes, Chico Ginú e Figueiredo) na vila Restauração, o sr. José Ripardo foi advertido que não podia plantar capim numa nova área que acabara de queimar. No dia seguinte a saída da equipe do ICMBio, ele deu início ao plantio de capim! O sr. José Ripardo também abriu um comércio na vila e uma serraria, que beneficiou boa parte da madeira usada nas casas do crédito - moradia do Incra. Este comércio foi recentemente vendido a um outro comerciante da sede do município (que atende pelo apelido de “Ceará”), assim também como o gado, este repassado para outro comerciante, desta vez de Cruzeiro do Sul e que atende pelo apelido de “Socó”.

Como é possível tanto desafio a Justiça do nosso país e as leis da Reserva?

No exato momento em que escrevo esta carta, o sr. José Ripardo deu início as obras de um novo ponto comercial, de dois pisos, utilizando justamente a madeira retirada de que falei acima [aí na foto sendo beneficiada na serraria do infrator]. Esta obra, acredito, contém várias irregularidades, pois está tapando o caminho da escola, deslocando o trapicho de circulação dos moradores, deverá mexer com a rede elétrica da vila Restauração e desrespeitar o espaço privado de outras moradias. Além disso tudo, o sr. José Ripardo tem o costume de andar armado (revólver calibre 32). Isto intimida o restante dos moradores que, assim como eu, sentem-se prejudicados pelas ações deste sr. Pelas leis da Reserva, este tipo de infrator deveria ser expulso da Reserva.

Diante disso tudo, é urgente que as autoridades responsáveis tomem as providências para impedir esta obra e as irregularidades de retirada de madeira, abertura de pastagens e comercialização de terras que vem acontecendo aqui na Restauração, justamente o local onde começou a luta pela criação da Reserva.

Francisco das Chagas Bezerra do Nascimento (Nino)
68 84118437