terça-feira, 23 de setembro de 2008

Quando eu envelhecer...

... quero ser que nem o seu Antonio de Paula.
Seu Antonio de Paula fez 80 anos no dia 12 de janeiro passado. Cearense de nascimento, na década de 50 veio para o Acre destinado aos seringais do Tarauacá. Foi desta feita, em Manaus, onde passou uma semana, que provou o guaraná Baré pela primeira vez, conforme contei na postagem anterior. No Acre, aportou primeiro no seringal Alagoas, mas logo mudou-se para as águas do Bagé, afluente do Tejo, no Alto Juruá. Lá, seu Antonio se casou e criou família. Morou, muito tempo depois, no rio Azul, afluente do rio Moa, e depois mudou-se para Cruzeiro do Sul, época em que tornou-se um agente de saúde. Desde 1990 envolveu-se com os trabalhos da Reserva Extrativista, primeiro na Cooperativa, depois coordenando um projeto de saúde por uma década.

Ah, seu Antonio tem história! Aqui, foi só um pedacinho, bem pequenininho. Um aluno meu, o Izonel, está pesquisando a vida do seu Antonio como material central de sua monografia. Cultivo a idéia de editar um livro contando a história do seu Antonio, por ele mesmo, com fotos e documentos. Este plano está na gaveta, prester a vir à tona. O seu Antonio merece.

Esses dias, aqui na Yorenka Ãtame, o seu Antonio foi um companheiro de atividade que já deixou saudades, pois hoje cedo ele voltou para Cruzeiro. Nesses quase quatro dias que passamos juntos, seu Antonio cantou muito e contou casos até não mais poder. É, seu Antonio é um cantor de mão cheia, tem um repertório do fundo do baú, daquele baú de bom gosto, claro. Bolero, samba-canção, hoje até uns belos hinos evangélicos ele tirou da cartola! Verinha pediu e ele por diversas vezes ele cantou “Maria Bonita”, aquela canção que o Caetano até gravou no CD “Fina Estampa”. Um deleite na voz melodiosa do seu Antonio, só ouvindo! Até hoje lembro vivamente, e não sou só eu, das reuniões que fazíamos na foz do Tejo e que, por volta das cinco e meia da manhã, seu Antonio nos acordava com sua inconfundível cantoria.

Um contador de casos, e também piadas. Passei esses dias ouvindo histórias dos antigos, casos engraçados, dando muita risada junto com todos que ouviam. E quando se animava, seu Antonio emendava um caso no outro, uma piada na outra, e vamos embora! Além de sua prodigiosa e invejável memória – algo digno de nota – essas histórias traziam à luz personagens já desaparecidos, veteranos dos seringais, seringueiros e patrões, nomes desconhecidos do público mas que nas narrativas de seu Antonio recebiam uma última homenagem.

O considero um grande e querido amigo, e uma coisa bacana de ver é o quanto outros que o conhecem nutrem um sentimento parecido, gostam de estar com ele, ficam felizes com sua presença. É muito bacana ver o respeito que ele desfruta por parte de pessoas de sua mesma idade e de mais jovens também. Ele tem um belo patrimônio: a bem-querença de todos. Ele disse algo assim: “eu sou feliz, sou feliz porque eu não guardo ressentimento”. Isso é uma sabedoria, isso dá uma leveza. Seu Antonio parece um passarinho-cantor daqueles que a gente se alegra quando aparece. Quero ter esta sabedoria quando eu for uma velhinha, uma velhinha-passarinha.

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