sábado, 30 de janeiro de 2010

Dois Cariocas no Rio (I)

Estamos de férias no Rio desde o último dia 28. Ora, já não era sem tempo: Zé Carlos, que é Carioca no sobrenome, nunca havia vindo ao Rio, e eu, Carioca de coração e criação, estava com saudades da terrinha e da água do mar.

Tomamos o avião madrugadeiro da Gol em Rio Branco, rápida conexão em Brasília, outra bem longa em Guarulhos (SP) e aportamos no Tom Jobim no meio da tarde. Minha cunhada Dani nos buscou e viemos para o Flamengo, casa de Maria e Antonio Carlos, meus pais e porto seguro aqui na Cidade Maravilhosa.

Sábado foi dia de descanso. À noite fomos na famosa “Esfiha” – nome pelo qual toda uma geração conhece uma lanchonete de comida árabe no Largo do Machado – e também ao cinema. Vimos “O Fim da Escuridão” (Edge os Darkness), com Mel Gibson. Recomendo, bom filme policial com trama inteligente e política.

Hoje nos demos de presente uma manhã no Jardim Botânico. Há anos não ia lá, nossa, muito tempo mesmo. Ano passado planejei e não consegui cumprir o planejado. Ainda em Rio Branco, Ailton Krenak foi enfático: “não deixe de ir ao Jardim Botânico!”.

Claro, boa lembrança. Fomos então, tomar café da manhã lá com Júlia, amiga e parenta queridíssima, e passear pelas alamedas cheias de árvores e plantas do mundo inteiro. Tiramos várias fotos, curtimos o visual, as fontes e caminhos. O orquidário foi um capítulo à parte, cada uma mais surpreendente que a outra. Tudo muito cuidado e agradável.

Fechamos o dia agora há pouco, com um banho de início de noite - de lua cheia - na praia do Leme...

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

Despacho literário!

Estou eu aqui de novo às voltas com o assunto do meu livro. O fato é que desde o seu lançamento, em 2008, estou descobrindo a duras penas as agruras de circular um livro a partir de uma editora universitária nos "confins" da Amazônia. Não é fácil. Minha primeira medida, claro, foi colocá-lo à disposição nas livrarias da cidade, e o fiz na Paim e Nobel. Levei séculos mas consegui colocar o livro no catálogo do site da Livraria Cultura. Estou numa negociação para ter o livro à venda no site do ISA, que só não se concretizou ainda por dificuldades burocráticas, apesar da super-boa vontade de ambas as partes. Que mais?

Procurei a Biblioteca Pública aqui em Rio Branco para saber o destino dos 50 exemplares destinados a FEM, pois desejava doar aqueles que por ventura estivessem faltando para que o livro pudesse estar no acervo de todas as bibliotecas e casas de leitura estaduais. Num primeiro momento, não se conseguia localizar os livros, depois de algum tempo foi-me dito que os mesmos ainda não haviam vindo da FEM, que, por sua vez, disse que "não, foram sim...". E aí o fim do ano chegou e eu deixei a empreitada para este ano.

Como uma caixeira viajante, sempre que viajo levo o livro e dou ou vendo para alguém ou alguma instituição relevante. Sinto que ainda falta fazer um pente fino aqui em Rio Branco mesmo, inclusive na Biblioteca da UFAC, para saber mesmo quantos exemplares tem lá.

Mas o fato é que a maior parte dos livros, cerca de 800, vieram aqui para casa e é daqui, portanto, que estou fazendo esta distribuição pra lá de doméstica. (A EDUFAC, claro, também está fazendo sua parte, mas falo aqui dos meus particulares esforços.) O fato é que findei o ano com uma sensação meio desconfortável, um "peso": aquelas caixas todas aqui, um monte de livros, e eu meio que sem saber como fazer. Outro dia, conversando com o Ailton Krenak, ele me tranquilizou: "o livro vai seguir o seu caminho". Tem razão. Mas resolvi dar um empurrãozinho:

Fiz uma demorada e laboriosa pesquisa na internet, e reuni cerca de 60 endereços de bibliotecas públicas, em especial de instituições universitárias federais e algumas estaduais. Fiz uma carta de doação, e embalei, com ajuda de minha comadre Mariazinha, uma das personagens do livro, um a um. Hoje, com ajuda do meu super-companheiro Zé Carlos, que carregou as caixas pesadíssimas, e assumindo os custos financeiros da empreitada, fui aos Correios e despachei Os Milton para o Brasil!

Rogo que eles cheguem aos seus destinos, sejam bem acolhidos (como merecem) e passem a habitar o imaginário de mais brasileiros.

sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Um ano de vida!

Ontem foi aniversário da Estér Vitória, esta pequenininha que vocês vêem aí acima, no colo da mãe, a Lili, junto com o pai, o Jefferson, e o irmão Pedro. A data natalícia da Estér, nome bíblico cujo significado é "Estrela", foi motivo de grande alegria. Afinal, a Estér é uma jóia mimosa que veio de longe, lá das ondas do mar sagrado, no estado de Pernambuco, para morar com sua nova família aqui no Acre, na floresta, onde, se Deus quiser, ela vai conhecer o poder que aqui reina e aumentar sua fé, sua confiança na vida e em si mesma.

Ah, eu adorei conhecer a Estér, desde a primeira vez que a vi, há umas duas semanas. Você chega e ela já está toda feliz, dando gritinhos pela casa. Gosta das pessoas, vai no colo e encosta a cabeça no seu ombro, toda querida. Ela mostra, todo instante, que está feliz com o presente que a vida lhe deu: uma família, amor e carinho. Nas fotos acima e abaixo, além da família mais imediata, aparecem também as avós maternas (acima) e paterna (abaixo). O tio Robson, que não aparece nas fotos, é outro "coruja" de plantão e gentilmente sempre cede o seu cangote para a sobrinha passear e olhar o mundo de cima.

Que a Estér siga assim: sendo ela mesma, na espontaneidade do seu coração, dizendo ao mundo da sua felicidade e contagiando a gente com sua vitalidade. A vida mal começou, e a Estér já pode dizer que é uma vitoriosa!

Longa vida, muita saúde e alegria para a Estér Vitória! Viva a aniversariante! Viva!


sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

Volta na Reserva - final

Nesta postagem final de minha última viagem ao Alto Juruá em 2009, resolvi adotar um viés mais estético e colocar imagens que atraíram o meu olhar, que me deram prazer de ver e registrar, que falaram a minha memória visual e afetiva.

Começo com a macaxeira, cuja farinha não pode faltar na dieta seringueira do Alto Juruá. Esta aí, já "arrancada" e "descascada" estava aguardando ser "lavada" para então ir para o "banco" ser cevada, e virar a "massa" que, depois de "prensada", será "peneirada" e "torrada", virando finalmente a farinha! Farinhadas sempre foram das ocasiões preferidas para mim: a família toda ali trabalhando, o dia inteiro na casa da farinha, refeições, conversas, tirar goma para tapioca. Sim, porque há inúmeros derivados da macaxeira: goma pra tapioca e para fazer farinha de tapioca, que depois dá um mingau supimpa, o tucupi, o biju, o biju na folha, e a farinha, é claro. Incrível as batatas de macaxeira, branquinhas, tiradas de dentro da terra - um milagre como destes que só a natureza é capaz.

Esta senhora aí abaixo é a dona Maria, mora do São João do Breu, na comunidade Morro da Glória, é madrasta do Altemir, que visitamos lá. Quando a vi relembrei que a conhecera em 1991, durante o cadastramento dos moradores da Reserva. Fiquei na varanda da casa dela conversando com ela e o marido até o anoitecer, conversa boa, daquelas de gente idosa que sabe conversar, sabe? Ela me remeteu muito à figura de uma ex-escrava, uma descendente de escravos que ela deve ser, aquela mulher negra ali no meio da floresta, tinha uma beleza ali muito particular.

Bom, aí abaixo é um berçário: um viveiro de mudas de açaí (ou abacaba, não recordo bem), que fica lá na casa do Antonio Caxixa, com quem viajei. Um encanto.

Subindo o Tejo, paramos no Iracema e tomamos um café com biju na casa da Tonha, aí abaixo. Lá vi este armário de dar inveja a qualquer dona de casa! Há outros na Reserva, muitos até, vários estilos. Coloquei este aqui, com a Tonha na foto. Vocês acreditam que ela e o marido estão planejando ir embora para a sede municipal e deixar sua casa e benfeitorias para trás? Tudo por causa de escola para os filhos. Sei lá, ponderei com ela que talvez os filhos pudessem esperar um pouco para cursar o 2o grau e aprender um pouco mais sobre a arte do bom viver.

Em seguida, na localidade Refrigério, encontramos a Eliéte, mulher trabalhadora como só visto! Ela e o marido, o João Belo, estão implantando um sistema agroflorestal (SAF) com muita dedicação e esforço. A Eliéte é especialmente talentosa e disposta - uma força. E ali, no meio do SAF, no meio das macaxeiras, milhos, abacaxis e aguanos encontramos este jardim de flor, que, conta ela, plantou para seu prazer e embelezamento do lugar.

Lá na vila Restauração o Caxixa encontrou com sua filha mais velha. Esta moça bonita aí abaixo é fruto de um namoro que não foi pra frente, foi (bem) criada por um outro pai e agora, nos últimos meses, reatou o contato com seu pai biológico, o Caxixa, aí na foto ao lado dela. Pai e filha, gostei da foto, e de ter compartilhado o encontro com o Caxixa, que estava muito feliz.

Já na hora de ir embora da casa de seu Milton e dona Mariana, me pediram para tirar a foto abaixo: Caxixa, dona Mariana, Hilde (nora de dona Mariana) e Salomão (filho de Hilde e neto de dona Mariana). Achei o máximo a posição que eles, por si próprios, assumiram para a foto: uma escadinha de gente amiga!

E pra finalizar este tour, mais uma foto da índia Kuntanawa Mariana. Ela, soube ontem, já está em Cruzeiro do Sul. Está internada, pois a malária a debilitou muito. Mas está melhor, disseram-me. Vai aqui uma outra homenagem a ela, com saudades e votos de pleno restabelecimento.


terça-feira, 12 de janeiro de 2010

Volta na Reserva 4

Acho que vale à pena atualizarmos nossas fotos da vila Restauração que, sim, não pára de crescer. Algumas mudanças interessantes após a posse do prefeito, ano passado, e a nomeação de um novo subprefeito, o Nino: a vila agora conta com uma iniciativa de plantio de árvores frutíferas na qual boa parte das mudas vieram dos viveiros Kuntanawa vizinhos e também doados por Caxixa, nosso técnico de campo do projeto Funbio e também funcionário da Secretaria Municipal de Agricultura. O gado também foi todo finalmente retirado da área residencial, e o lixo alocado em um local específico (embora não necessariamente próprio, parece que é uma edificação mesmo). Esta aí abaixo é a sede da subprefeitura.

Pude ver que as casas aumentaram e a área ocupada pela vila expandiu-se. Mas enxerguei também mais fruteiras plantadas, bananais e alguns milharais. Desapareceu a centenária Samaúma que desde sempre esteve ali: deu lugar ao progresso, leia-se uma pista de pouso que foi aberta pela prefeitura e da qual os moradores têm muito orgulho. Não pude visitá-la, mas soube que estava em manutenção devido ao inverno.
A igreja católica recebeu nova pintura.

A vila conta agora com um hotel (olha o letreiro lá em cima na foto abaixo).

A escola de segundo grau foi ampliada com mais um bloco de salas. As igrejas evangélicas cresceram: são quatro agora. O açude do Osterno, do outro lado do rio, em frente à vila, tem abastecido os moradores com peixe.
Taí, a vila, um lugar estabelecido, um jeito de morar na floresta. Isso está merecendo um estudo mais apurado um pouco, vocês não acham?

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

Uma volta na Reserva 3

É verdade, já faz um tempinho que voltei da viagem ao Alto Juruá, no ano passado... Mas tem coisa ainda pra contar!

Hoje quero falar do aniversário da dona Mariana, a esposa do seu Milton, matriarca dos Kuntanawa. Ela completou 80 anos de idade no dia 29 de novembro, um domingo. Cheguei na casa dela neste mesmo dia, na parte da tarde. Ela nem esperava mais a nossa chegada (do Caxixa, meu companheiro de viagem, e minha), mas foi como disse a ela: "eu não disse que vinha?!".

Na foto, Hilde, nora de dona Mariana e seu Milton, esposa de Cidoca (à esquerda), serve os presentes.

Não havia propriamente uma festa, mas a casa estava lotada de filhos, netos e bisnetos - uma algazarra! E reunir-se para a refeição é sempre o melhor pretexto. No chão mesmo, a moda seringueira e indígena. Panela sob o comando feminino, pratos em volta, as pessoas vão se sentando, adultos, crianças e até o papagaio chega junto. Muita conversa, risadagem, pratos que vão sendo compartilhados, em especial por crianças e mães e filhos.

Dona Mariana já não tem mais aquela saúde para chefiar a cozinha, e quem costuma fazer isso são suas noras ou então seu marido, seu Milton. Todo dia de manhã nosso "mestre cuca", como eu brincava, assumia o fogão e fazia um delicioso mingau de banana grande para nosso desjejum. Na foto acima está ele comendo o repasto, todo animado. "Menino sambudo", costumava dizer sua falecida mãe, dona Raimunda.

Mas falemos um pouco mais de dona Mariana, a "índia velha", como ela mesmo se definiu, nossa homenageada hoje aqui.

Tem passado os dias mais em casa, numa rede armada na cozinha ou então na sala. À sua casa então deve ir quem quer falar com ela, como o fez Nízia, moradora do Riozinho e que a procurou para tratar de "assuntos de mulher": dona Mariana é parteira renomada e conhecedora desses assuntos. Hoje, devido a idade e a fraqueza que sente, afirma não poder mais fazer o que sempre gostou, como mariscar e andar na mata. Sua caminhada mais arrojada é uma ida a um igarapé nas proximidades para tomar banho na hora do sol quente. Ela se queixa, mas sabe se alegrar também com as coisas do cotidiano, como as contas (sementes e missangas) que junta para fazer artesanato e dividir com seus netos e netas.

Sua mente é sã e do alto dos seus 80 anos e experiência de vida assiste seus filhos e netos refundando a etnia julgada desaparecida e da qual ela talvez seja uma das últimas descendentes diretas: sua mãe era Kuntanawa capturada nas matas do rio Envira.

Quando nos despedimos, a pergunta de sempre: "quando nos vemos de novo?". Não sei, dona Mariana, não sei. Quero crer que em não muito tempo. Hoje soube, por uma de suas noras, que ela está com malária e encontra-se agora na sede municipal de Marechal Thaumaturgo com o marido e deve ir a Cruzeiro do Sul. Vou ligar para eles hoje e tentar saber mais detalhes.

Saúde para a nossa índia velha querida, baluarte e tesouro Kuntanawa!