quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Pirataria-net (da perna-de-pau)

Há dois dias, pesquisando na internet informações sobre os Kuntanawa, deparei-me com uma referência "Os Kuntanawa e a ayahuasca". Opa, vou lá ver, o tema me interessa, quem será que está escrevendo ou o que será que estão dizendo?

Clico então no link (clique vc também).

O que encontro?

Primeiro, uma foto do Osmildo de minha autoria, e logo mais abaixo outra de seu Milton também de minha autoria. Créditos? Claro que nenhum. As demais fotos não conheço. Já fiquei meio incomodada.

Vou ler o texto. Epa, tá meio familiar... Ora, o texto é meu, rapaz! Pois é, o texto é meu. Mas, da onde o cara pode ter tirado o texto, da onde? Hum, deixa eu ver... Ah, sim, do site do Instituto Socioambiental, do verbete "Kuntanawa" que eu mesma escrevi. As fotos também vieram de lá, onde estão devidamente identificadas e creditadas, assim como o texto.

Fiquei fula da vida. Tentei postar um comentário no site ladrão, mas não consegui saber como fazê-lo. Cadastrei-me, registrei senha etc etc, mas não consegui postar nenhum comentário - queria protestar! Aí descobri um outro endereço eletrônico do moderador do tema da "ayahuasca", que atende pelo nome "eusonho". Escrevi protestando.

Poucos dias depois, sem nenhum retorno dele, vim escrever esta postagem. Qual a minha surpresa quando vou novamente olhar meu texto no site e está lá, no final do texto, minha autoria! Quer dizer, está assim:

"Texto:
Mariana
Sexo: Feminino
Quem sou eu

Gosto de ser, entre outras coisas, antropóloga. Ando pelo Acre, este pequeno-grande estado amazônico, desde 1991. Na capital Rio Branco, estou desde 2002. Moro numa "colocaçãozinha" urbana (pergunte a um seringueiro o que é isso). Aqui, na floresta, faço todos os meus trabalhos: pessoais, intelectuais, sociais e espirituais. Idéias e sensações têm aflorado nos últimos tempos, e algumas delas pedem para sair e se expor. Daí vem este blog: um pouco de tudo, de tudo um pouco."

Ou seja, foi justamente retirado deste blog. Aí fiquei na maior dúvida: isso já estava aí ou foi colocado após os meus protestos? Fiquei alguns dias pensando nisso. Não tenho 100% de certeza, mas estou quase certo que o adendo é novo. Não lembro dele antes, e olha que ele está assim mesmo, em negrito e numa fonte maior. De todo jeito, isso lá é jeito de creditar um texto? Quem é "Mariana"? Não dá nem o endereço do blog!

Então, tá aqui, meu protesto registrado sobre a forma leviana como produções próprias podem ser tratadas. Não há nenhum problema em reproduzir os textos - estou mais para Creative Commons do que para Copyright - mas à César o que é de César. Ou eu estou sonhando ou o outro está viajando!

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

"A Terra é nosso parente"

POR JOSÉ RIBAMAR BESSA FREIRE

Talvez a mimosa pudica possa nos ajudar a entender a tragédia que se abateu nessa semana sobre a região serrana do Rio de Janeiro, causando mais de 600 mortes. A mimosa é uma plantinha sensitiva, conhecida popularmente como “dormideira”, “morre João’ ou “Maria-fecha a porta”, encontrada em locais úmidos da Mata Atlântica ou da Floresta Amazônica. Possui flores pequenas, cor de rosa, um caule com espinhos e folhas divididas em vários folíolos. O que ela tem a ver com as chuvas torrenciais que tantos estragos fizeram?

As imagens da TV mostraram um quadro desolador, com depoimentos dramáticos de sobreviventes. A correnteza, com forte estrondo, vem descendo do alto da serra. No caminho, arranca árvores, desenterra pedras, soterra casas e arrasta tudo o que encontra em sua frente: casas, carros, pontes, gente, bichos, corpos, barro, lama, entulho, lixo. Barreiras desabam nas áreas de encostas. Pequenos córregos e riachos se transformam em rios caudalosos que transbordam, irrompem velozmente pelas cidades e racham o asfalto, engolindo ruas, praças, bairros, semeando dor, sofrimento, morte. Um cenário de terra arrasada: escombros, devastação, destruição.

Ainda estamos contando, enterrando e chorando os mortos e os desabrigados em cinco cidades do Rio. A tragédia, em menores proporções, atingiu São Paulo, cuja capital ficou submersa, dando um nó no trânsito. A Folha publicou quarta-feira (12) foto impressionante: toneladas de garrafas plásticas cobrem o rio Pinheiro, que transbordou. Em Minas Gerais, 72 municípios estão debaixo d’água. A chuva castigou outros países - Austrália, Filipinas e Sri Lanka. Por que tanta raiva e tanta violência da natureza? Parece que o planeta está reagindo e é aqui que entra a Maria fecha a porta.

Teu pai morreu


A última vez que vi a Maria foi em setembro de 2007, em Soure, Ilha do Marajó, acompanhado de uma pajé cabocla, Zeneida Lima, e de um sábio guarani, então com 96 anos, o karai Tupá Werá, da Aldeia de M’Biguaçu (SC). Não resisti em reconstituir uma brincadeira de infância em Manaus, que consiste em passar a ponta do dedo no meio da sua folha, dizendo: “Maria, fecha a porta que teu pai morreu”. Ela fecha. Os folíolos obedecem sempre, se inclinam numa reverência e imediatamente murcham, para logo em seguida, com o pai ressuscitado, voltarem à posição normal.

Tem algo de mágico para uma criança falar com uma planta, trocar sensibilidade com ela, provocá-la e obter uma resposta imediata, o que não é nenhuma novidade para os índios para quem não é só a Maria que fecha sua porta, é possível falar com a Terra, as plantas, os bichos, os rios, os morros, as pedras. É outro sistema de pensamento. O guarani Marcos Moreira, meu aluno no curso de formação de professores, entrevistou para um trabalho de avaliação o velho karai Alexandre Acosta, da Aldeia de Jataity (RS) que declarou, entre outras coisas:

- Esta Terra que pisamos, é gente como nós, é nosso irmão. É por isso que o guarani respeita a Terra, que é também um guarani. O guarani não polui a água, pois é o sangue de um karai. Esta Terra tem vida, só que muita gente não sabe. É uma pessoa, tem alma. A mata, por exemplo, quando um guarani precisa cortar uma árvore pede licença, porque sabe que ela é uma pessoa. A Terra é nosso parente, mas está acima de nós. Por isso ensinamos as crianças a respeitarem a Terra, que até hoje se movimenta, só que não percebemos. Quando os parentes morrem, carne e corpo se misturam com a terra. Por isso, temos que respeitar esta terra e este mundo em que a gente vive.

A tragédia vivida em diferentes partes do Planeta nessa última semana não é um acidente natural, mas produto de uma intervenção desastrada do homem, que esqueceu que a Terra é gente como nós. As chuvas, que aterrorizam e paralisam as cidades, não causam tais estragos numa aldeia indígena. É que as cidades cresceram sem respeito ao “nosso parente”, se expandiram sem “pedir licença”, isto é, desordenadamente, agressivamente, sem planejamento de impacto ambiental e adoção de medidas para proteção de encostas, reflorestamento, uso do solo e destino do lixo urbano.

Jogar no mato


Na busca do lucro rápido, a especulação imobiliária desmatou indiscriminadamente, construiu em encostas, alterou os caminhos naturais da drenagem da água, tornando instáveis os terrenos e ferindo de morte a terra. Expulsos das áreas mais nobres, os deserdados abriram ainda mais a ferida, construindo perigosamente nos morros. Hoje, as cidades não ensinam às crianças sequer a tratar o lixo.

Quando chove, minha rua alaga. Da janela do meu apartamento, contemplo a estupidez humana. Vejo boiando garrafas pet, sacos de plástico, embalagens de alumínio, latas de refrigerantes, que entopem as grelhas dos bueiros das galerias pluviais, prejudicando a vazão da água. Na minha infância, a vovó Filó recomendava dar um destino ao lixo: “joga no mato”. Mas o lixo atirado no quintal era sobra de alimentos, casca de banana e de outras frutas, bagaço de laranja, que adubavam a terra.

Hoje, o lixo é formado por resíduos sólidos, embalagens descartáveis de plástico, lata, vidro, alumínio, mas continua predominando a mentalidade de “jogar no mato”. A foto da Folha de São Paulo é uma prova gritante do fracasso da educação ambiental na escola e no ambiente familiar. Crianças e adultos atiram o lixo em espaços coletivos, com a mentalidade patriarcal de que o espaço público é terra de ninguém e de que existem garis para limpar nossa sujeira. Quem a terra fere, com a terra será ferido?

Na visita feita ao sítio da pajé Zeneida Lima, em Soure, ela entrou no mato com o guarani Tupã Werá, conhecido no mundo não indígena como Alcindo Moreira. Os dois trocaram informações. Ali, onde qualquer pessoa, mesmo o paraense comum, só via árvores genéricas, eles viam cada espécie em particular. Alcindo dava o nome em guarani, algumas vezes também em português, descrevendo as propriedades medicinais ou alimentícias de cada planta.

- As árvores falam. A gente é que desaprendeu e não sabe mais escutar o que elas dizem - disse.

Gabriel Garcia Márquez conta que em dezembro de 1981 recebeu telefonema de um amigo sério e inteligente, perguntando-lhe qual era o tema da crônica da semana, que seria publicada no dia seguinte no jornal El Espectador, de Bogotá. Ele respondeu que estava escrevendo sobre o sofrimento das plantas e das flores, sustentando que elas têm alma. Alarmado, o amigo exclamou:

- Ay, carajo! Te estás volviendo maricón?.

Meus amigos do Ceará me informam que o governador Cid Gomes - aquele que levou a sogra para Paris com dinheiro público - encaminhou à Assembléia Legislativa, em caráter de urgência, Projeto de Lei que dá poderes extraordinários ao governador para dispensar de licenciamento ambiental no Estado do Ceará uma série de atividades, dentre as quais o desmatamento, os aterros sanitários, habitação dita de interesse social, estradas de rodagem, projetos agropecuários e outras atividades e obras modificadoras do meio ambiente.

Enquanto o planeta for povoado por machos dessa estirpe, que formulam e implementam políticas públicas, não ouviremos a voz da terra e as tragédias se repetirão. Maria, fecha a porta que teu pai está morrendo.

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Santos Reis

"Os três Reis do Oriente, que visitaram Jesus..."

Viva os Santos Reis! Que eles possam nos presentear, nos levando a visitar o Jesus que habita em cada um de nós.

sábado, 1 de janeiro de 2011

Saramago para o Novo Ano

A vida é breve, mas cabe nela muito mais do que somos capazes de viver.
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Fugir da morte pode tornar-se uma forma de fugir da vida.
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O homem é o único animal capaz de chorar. E de sorrir. É diante do mar que o riso e a lágrima assumem uma importância absoluta. Dir-se-á que mais profundamente a assumiriam diante do universo, mas este, digo eu, está demasiadamente longe, fora do alcance de uma compreensão comum. O mar é o universo dentro de nós.
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Dentro de nós há uma coisa que não tem nome, essa coisa é o que somos.