segunda-feira, 21 de julho de 2008

O tempo em mim


Hoje estava na cozinha, a TV ligada, e ouvi uma propaganda de um produto de beleza, desses tipo miraculosos, e que dizia algo como "não deixe ninguém perceber que o tempo passou [e que agora você tem rugas]". Não foi a primeira vez que este anúncio, ou "reclame", como dizia minha avó, sobre um creme para o contorno dos olhos me chamou atenção. Num outro da Natura também já tinha reparado: um que vai mostrando cremes diversos e mulheres comuns sempre aparentando menos idade do que supostamente teriam - e isso as faz belas. Mesmo cremes para mulheres mais maduras, ou idosas, visam sempre disfarçar algo que se tem: as marcas do tempo. E a beleza das rugas?, me perguntei. Bom, é certo que "rugas" é uma palavra meio feiosa: ru-ga, sei lá, não gosto. Uma ruga é uma dobra que foi feita em algo que antes era liso, ou esticado. O seu rosto, outrora esticado, dobrou aqui e ali. Mas este "aqui e ali" é justamente o retrato externo do que se é, da vida que se viveu e da transitoriedade da vida. É bonito isso, penso. A conformação que seu rosto foi adquirindo durante a vida, as marcas do sorriso (populares "pé de galinha"), as rugas na testa pela preocupação - tudo isso é um patrimônio, pessoal e instransferível. Cruel esta nossa sociedade que quer mexer nisso, em nós e no tempo. Apague as marcas. Apague-as, são feias. Elas falam de você. É claro que uma plástica também fala de você: da vaidade, por exemplo. Isto não é necessariamente ruim, e o resultado pode ser bonito e fazer a pessoa mais feliz. Tudo bem. Mas falo por mim, do que fiquei pensando a partir daquele anúncio na TV. Gostaria de passar por esta vida sem fazer uma plástica, sinceramente gostaria. Ser eu mesma, assumir-me até as últimas consequências. Quero ter esta coragem. E quero mais: quero viver muito e ter auto-estima para encarar minhas rugas, as transformações do tempo, e ver nelas (e em mim) uma vida e uma pessoa que valem à pena. E ainda por cima sem maquiagem!

4 comentários:

Anônimo disse...

Lembrou a nossa conversa com D. Heloisa ontem.E também da expressão de minha vó antes(refletindo a dor e o sofrimento de seus últimos tempos de vida) e depois de sua passagem para o mundo espiritual(refletindo a serenidade e o alívio do descanso merecido).

Bjs.

karlota disse...

A atriz Henriette Morineau, grande dama do nosso teatro brasileiro, fez algumas participações em novelas da Globo, já com idade bem avançada. Contam os maquiadores mais antigos que ela quando ia para a maquiagem e começavam a disfarçar sua idade (ela já tinha mais de 60.)ordenava que parasse imediatamente e comentava: - Não disfarçem algo que a vida demorou tanto para me presentear ! E com uma risada triunfante removia o excesso de maquiagem. Eu sempre lembro disso quando penso sobre o assunto idade e as pressões do tipo : Pinta o cabelo, tá com cara de velha! ou outras com o mesmo fim. Sem querer desconsiderar todos os tratamentos estéticos e quem de maneira disciplinada faz uso deles , mas acho que você está certa deixe que o tempo chegue com a sua beleza. O desafio é aprender fazer uso dessa beleza! Mas olha, para ti isso ainda demora,afinal com essa cara de menina...Rsss. Bj e carinho.

morenocris disse...

A própria floresta te oferece produtos contra o tempo. Engraçado que lutam no Acre atualmente contra o tempo. Estamos sempre lutando contra o tempo. Sempre lutando. Construindo. Demolindo. Dando 'ré' - reconstruindo. Contra o tempo. Mas pára para pensar. A propaganda não luta contra o tempo, pelo contrário. Ela quer que o tempo pare, simplesmente. Veja a propaganda de roupas. Ela quer nos cobrir. Do sabonete. Nos limpar. De comida. Satisfazer. De carro. Nos conduzir. De amor. Nos amar. A propaganda é a alma dos sonhos. Compra quem quer e quem pode. Já viu isto? Já. Faz 'tempo' que se vende sonhos. E até o tempo. Sabes, o tempo passa por nós, "mas os meus cabelos..."(lembra dessa?). Sobre o tempo Brigite Bardot é um bom exemplo. Pensa como vc. Plástica? É para quem tem dinheiro. Não acho 'ruga' uma palavra chata e nem feia. Aliás, tudo é tão normal para mim. Tempo, sonhos, plásticas, caramba...como posso ser tão desligada de tudo? Como tudo é tão 'normal' para mim? Preciso tanto de mistérios. Surpresas. Impacto. Será que neste século nada mais nos surpreenderá? Nada de novo no front? Perdoa-me. Não estou legal hoje. Aproveitei-me de seu post...

Beijos.

Como foi o vernissage sobre as mandalas?

:)

Dona Sra. Urtigão disse...

Excelente! Eu afirmei em um texto no blog que criei -Sou uma velha, mais velha do que sou. Não estou conservada em botox, tintas ou cremes. Estou curtida pelo sol e pelo vento, pela dor e pelo mêdo. Estou feliz.
Um abraço, siga feliz.