Nós, líderes máximos dos povos da civilização xinguana, reunidos na aldeia kuikuro de Ipatse, em 21 de julho de 2007, queremos compartilhar com a nação brasileira a grave situação vivida no Parque Indígena do Xingu (PIX). Nossa civilização milenar vem resistindo há quinhentos anos a guerras de conquista, escravização, epidemias e roubo de terras. Nos últimos anos, a irresponsabilidade social e ambiental na região das cabeceiras dos formadores do rio Xingu coloca em risco a nossa saúde e a continuidade de nossa cultura. O desmatamento acelerado e irracional, a expansão agrícola, o uso desmesurado de agrotóxicos e, agora, a construção de barragens vêm destruindo a própria base de nossa subsistência. A poluição das águas e a contaminação do pescado são uma ameaça para o nosso futuro, não apenas por serem eles condição de nossa reprodução física, mas também de nossa vida cultural. Vivemos milenarmente nesta bacia de forma sustentável e em dependência direta dos recursos aquáticos.
Como representantes legítimos dos povos xinguanos solicitamos o apoio de toda a nação brasileira e da comunidade internacional para resistirmos a mais uma ameaça que nos cerca. Já perdemos boa parte de nossas terras com avanço da fronteira econômica e, agora, a destruição irracional ingressa na terra que nos resta. Exigimos um plano global de gestão da bacia do rio Xingu, não apenas no interior do PIX, mas que abarque toda a região dos formadores. A destruição iminente da bacia atinge a todos nós, índios e não-índios, e em particular às gerações futuras. Não podemos esperar mais 10 anos. O dano ambiental será irreversível. Queremos ações já para preservar um patrimônio que não é só nosso, mas da nação e de toda humanidade.
Em particular, exigimos:
- a imediata paralisação de todas as obras de barragens na região dos formadores;
- uma moratória sobre as licenças para instalação de novas PCHs;
- um estudo detalhado sobre a condição da água e do pescado;
- um plano de reflorestamento das margens dos rios e de seus afluentes;
- a recuperação da posse de áreas tradicionais excluídas da área do PIX;
- o reconhecimento e preservação de nossos locais sagrados, Sagihengu e Kamukwaká, que se encontram fora dos limites do PIX.
Afukaká Kuikuro
Kuiusi Kinsêdje
Tahukumã Kalapalo
Kugikagé Kalapalo
Jumuí Mehinaku
Aritana Yawalapiti
Jamatuá Matipu
Tirifé Nahukwá
Itsautako Waurá
[Esta carta foi divulgada em julho de 2007, e ela deve ser relida à luz dos últimos acontecimentos no PIX, ou seja, a retenção pelos índios de pesquisadores da empresa Paranatinga Energia S.A. e funcionários da Funai em protesto aos impactos ambientais causados pela construção de uma central hidrelétrica no rio Culuene, pela derrubada de árvores e uso descontrolado de agrotóxicos nas cabeceiras deste mesmo rio. O rio Culuene é um dos principais formadores do rio Xingu, mas suas cabeceiras, como as dos demais formadores dos principais rios que banham o PIX, estão localizadas fora dele (do PIX) e têm sido duramente castigadas por desmatamentos e contaminações. Para saber mais, clique aqui.]
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