domingo, 25 de novembro de 2007

Carta indígena - fronteira Brasil-Peru

24 de novembro de 2007

Aos Senhores Representantes de Instituições Governamentais, Não Governamentais e Organizações Indígenas do Brasil e do Peru

Nós, Asheninka da Terra Indígena Kampa do Rio Amônia (Comunidade Apiwtxa) e da Asociación de Comunidades Nativas de Ashanínkas-Ashenínkas de Masisea y Callería (ACONAMAC), vimos, por meio desta, informar e manifestar a nossa mais completa oposição à exploração madeireira que afeta diretamente todos os povos da fronteira Brasil-Peru, sobretudo as nossas comunidades que se localizam na região da linha de fronteira Brasil-Peru.

1 - No lado brasileiro da fronteira, nós estamos, desde 1999, junto à Justiça e a vários órgãos do governo brasileiro tentando impedir que nossa fronteira seja invadida brutalmente por empresas madeireiras autorizadas pelo Governo peruano para exploração comercial em área de concessões florestal e em terras indígenas peruanas. Nós temos uma política que é proteger a nossa biodiversidade para garantir a nossa tradição, utilizar os recursos naturais sem causar desequilíbrio ambiental, que deve ficar por conta do processo natural do Planeta. A nossa vida sempre foi assim, mas não sabemos mais até quando vamos suportar.

2 - No lado peruano, ainda hoje temos os mesmos problemas que aconteceram no Brasil há vários anos atrás, os povos indígenas submetido a regras dos madeireiros, sofrendo violências e sendo alvo de enganação. Hoje, muitas comunidades vêem suas lideranças tradicionais trocadas por novos representantes, que são preparados por empresas somente para usar seu povo como mão de obra barata e fácil de enganar, para tirar proveito. Como exemplo, temos duas terras indígenas no lado peruano, Sawawo e Nova Shawaya, próximas ao marco 40, que firmaram convênio com a empresa Forestal Venao para explorar em suas terras vários tipos de madeiras nobres e ganhar uma porcentagem. Legalmente, as comunidades estão contratando os serviços da empresa e assumindo as conseqüências negativas que acontecem no âmbito local, e nunca aparece a realidade em que eles vivem, ganham uma pequena parcela do lucro, ficando este para os representantes comunitários que gerenciam de acordo com suas políticas. Na realidade, estão vitimando pessoas e povos com a violação de seus direitos. A Forestal Venao não é a única empresa, existem outras, como RuBem, Cabrera e outras, em que o trabalho é muito mais complicado e mantem um povo tradicional em um sistema de escravidão. Queremos uma intervenção da Organização Internacional do Trabalho (OIT).

3 - Também temos visto e presenciado vários problemas de alcoolismo. O alcoolismo vem causando a desestruturação sociocultural do nosso povo, e gera pessoas que passam a ser destruidoras de suas próprias tradições e dos recursos naturais. O pouco dinheiro que ganham serve apenas para se prejudicar cada vez mais e ser mais dependente da exploração. Esse é um ciclo vicioso fomentado e imposto pelas empresas.

4 - No lado peruano, vários povos, assim como os Asheninka, há décadas vêm sendo usados para as frentes de exploração dos recursos naturais, muitas das vezes deixando suas terras de origem e acompanhando as empresas, eliminando vários conhecimentos do povo com relação à natureza e a nossa forma própria de utilizar os recursos naturais. Nessa luta, muitos povos também estão sendo eliminados. É o caso dos índios "isolados", as populações de índios em isolamento voluntário, que estão sendo mortas, sem que ninguém peça por eles. Nós presenciamos um fato de conflito entre nosso povo no Alto Juruá, no ano de 2003, onde tivemos depoimentos de Asheninka comentando que o conflito foi causado pelas empresas madeireiras, que expulsou os isolados de suas terras, matando vários deles.

5 - Também temos informações que grupos de exército Asheninka foram criados na época do Sendero para proteger o povo e hoje também são usados pelas empresas madeireiras, através das comunidades conveniadas, para vigiar seus trabalhos.

6 - O trabalho da empresa Forestal Venao, com duas comunidades aqui vizinhas à nossa, ganhou a certificação do padrão FSC. Nos perguntamos hoje se essa certificação foi dada para certificar o extermínio de várias espécies, florestais e animais. Também nos perguntamos se o plano de manejo certificado foi para invadir áreas da linha de fronteira e prejudicar diretamente o país vizinho e seus recursos, se foi para desrespeitar a faixa de 2 km (dois quilômetros) do trato de respeito à fronteira. Precisamos ver isso com mais atenção e mais detalhe, pois nessa região vivem seres humanos que precisam ser respeitados nos seus direitos. Também as Nações Unidas precisam ter conhecimento desse fato, e fazer valer o direito de cada povo ter direito à sobrevivência, não só o direito do homem sobreviver, mas o direito à proteção dos recursos naturais de que depende para viver, os rios, a flora e a fauna, que podem garantir, por fim, a vida do Planeta por mais tempo.

7 - No plano de exploração da Forestal Venao tudo parece perfeito, mas, na prática, a sua forma de exploração só tem gerado o extermínio de milhares de espécies e a poluição das águas, algumas das quais correm para o território brasileiro. Mais recentemente, começaram a chegar as concessões minerais e petrolíferas, que para nós serão uns dos maiores problemas e que precisam ser discutidos. E não aceitamos que as empresas tenham tratamento de vítimas, como é comum nos debates, onde colocam as mesmas como importantes e produtivas para o desenvolvimento da economia e os povos indígenas como improdutivos e atrasados.8 - Solicitamos a pronta manifestação das instituições endereçadas, e as convocamos para uma reunião na fronteira o mais rápido possível.

Assinam esta Carta
Associação Ashaninka do Rio Amônia (APIWTXA) e Asociación de Comunidades Nativas de Ashanínkas-Ashenínkas de Masisea y Callería (ACONAMAC)

Carta endereçada a: AIDESEP - Asociación Interétnica de Desarrollo de la Selva Peruana, Assembléia Legislativa do Estado do Acre, Conselho Nacional dos Seringueiros, COIAB - Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira, COICA - Coordinadora de las Organizaciones Indigenas de la Cuenca Amazonica, Colégio del Biólogos del Peru, Comissão da Amazônia, Integração Nacional e de Desenvolvimento Regional - CAINDR/Congresso Nacional do Brasil, Comissão de Direitos Humanos e Minorias – CDHM/Congresso Nacional do Brasil, CONAM, Consejo Nacional del Ambiente, Defensoria del Pueblo - Oficina Defensorial de Ucayali, Departamento da Polícia Federal, Governo do Estado do Acre, Exército Brasileiro, Ejército del Peru, FUNAI, IBAMA, INRENA - Instituto Nacional de Recursos Naturales/OSINFOR, Oficina de Supervisión de las Concesiones Forestales Maderables, Ministério da Defesa do Brasil, Ministerio de Defensa del Peru, Ministério do Meio Ambiente, Ministério da Justiça, Ministerio del Justicia del Peru, Ministério das Relações Exteriores do Brasil, Ministerio de Relaciones Exteriores del Peru, OEA, OIT, ONU, OTCA – Organização do tratado de Cooperação Amazônica, Presidência da República Federativa do Brasil, Presidencia de la República del Perú, Procuradoria Geral da República, 6ª Câmara de Coordenação e Revisão Índios e Minorias, SEMA-Acre, Secretaria Estadual de Meio Ambiente.

Um comentário:

Anônimo disse...

Pois é amigos Ashaninkas,

infelizmente é mais bonito fazer operações contra madeireiros no Abunã-Rondonia e contra caminhoneiros pequenos aqui no Acre porque assim não aparece na mídia que na terra da florestania, na terra dos irmãos Viana, na terra da Ministra Maria Osmarina não tem nada de errado...

e podem correr atrás mesmo do FSC porque se vcs ficarem quietinhos eles engolem vcs com esta certificação mequetrefe da Venao. Ter selo FSC não quer dizer muita coisa mais não. a lógica do selo, no final das contas é atender o capital. sedento pelo mogno de vcs.

alguém aí ouviu falar de operação contra serrarias no Acre???? Este ano??? ano passado??? é ruim héin. aqui na terra da ministra não pode aparecer os poddres não.