terça-feira, 2 de dezembro de 2008

Semana de Ciências Sociais

Na semana passada, o Centro Acadêmico do curso de Ciências Sociais da UFAC realizou a Semana de Ciências Sociais, que, em sua sexta edição, teve como tema “De Chico Mendes ao Estado da Florestania: os desafios da sustentabilidade”. De segunda a sexta-feira foram quatro mesas-redondas e uma palestra, as primeiras no auditório da Biblioteca da Floresta e a segunda no Teatrão, tendo como palestrante a senadora Marina Silva, uma esperada presença pelos alunos do curso.

Não pude participar ao longo da semana, por motivos pessoais achava-me fora de Rio Branco. Mas na sexta-feira apresentei-me aos organizadores da Semana para mediar a mesa de encerramento batizada de “Reservas Extrativistas (por onde anda a ‘reforma agrária do seringueiro’)”. Embora o folder não tenha registrado, tratava-se de uma pergunta: em que pé estão as propostas de regularização fundiária adaptadas ao modo de vida daqueles que vivem na floresta? São várias delas: além da mais conhecida – as Reservas Extrativistas, fonte de inspiração e mesmo mãe de todas as demais – há ainda os Projetos Agroextrativistas (PAEs) e os Projetos de Desenvolvimento Sustentável (PDS), além das Reservas de Desenvolvimento Sustentável (RDS), entre outros formatos que buscam conciliar conservação e a presença de populações florestais não-indígenas.

As Reservas Extrativistas foram propostas em 1985, por ocasião do I Encontro Nacional de Seringueiros, realizado em Brasília. Naquela época, era claro para os seringueiros reunidos em Brasília por meio de seus sindicatos, associações, cooperativas e comunidades eclesiais de base, que o formato tradicional da reforma agrária – lotes – era totalmente inadequado, e insustentável, para aqueles que vivem na floresta do agroextrativismo. Recortar áreas de floresta em lotes era uma lógica que só podia fazer sentido na cabeça e mapa dos técnicos e burocratas de escritório, que não sabiam (muitos seguem sem saber) que a caça, os peixes, os cursos e espelhos d’água, os piques de castanha e as estradas de seringa não obedecem a traços geométricos e não respeitam este tipo de fronteira. Uma reforma agrária que mantivesse o sistema de colocações e evitasse a fragmentação da unidade pela venda das posses ou propriedades individuais: estes critérios orientavam as propostas de então. Inspirados nas Terras Indígenas chegou-se ao formato das Reservas Extrativistas: propriedade da União com usos e frutos dos moradores.

Todo esse percurso histórico, e mais rico de detalhes, foi tratado por Raimundo Mendes de Barros, o Raimundão, primeiro a falar na mesa-redonda. Do alto de sua rica e já longa experiência como sindicalista e liderança de primeira hora, junto com outros, dos empates de então, Raimundão rememorou com emoção e de forma didática aqueles anos de esperança, lutas e criatividade, quando podia-se contar com a liderança inestimável de Chico Mendes. Em seguida, dona Maria das Dores da Silva Lima fez uma breve fala sobre o PAE São Luis do Remanso, onde vive. Dona Maria, que tem larga experiência a frente da organização local, focou sua fala nas iniciativas de manejo florestal (madeireiro e não) em curso no PAE. Com uma sutileza invejável, ela trouxe questões delicadas para discussão, como as irregularidades fundiárias presentes, os objetivos não só financeiros daqueles que aderem ao manejo, as políticas públicas que colocam esta opção [a do manejo] para os agroextrativistas, e não outras. O terceiro e último palestrante foi Eduardo Borges, o Cazuza, do Pesacre, que compartilhou com os presentes sua vivência de mais de dez anos na criação e implantação do PDS São Salvador, em Mâncio Lima, o primeiro criado no Acre. A presença e fala de Cazuza trouxeram a importância das parcerias na viabilização dessas áreas de reforma agrária, em particular com ONGs.

O debate foi animado, com muitos inscritos. Cheguei a pensar em fazer alguma fala, mas calculei que iria tomar mais tempo, havia uma ânsia da platéia em se manifestar e a noite era dos palestrantes. Então, me controlando com alguma dificuldade, não me manifestei sobre uma série de questões que apareceram e sobre as quais teria coisas a dizer. O manejo, como seria de se esperar, foi um tema bastante debatido. Ficou-me mais uma vez a impressão, que acabei explicitando ao final da noite, de que o debate em torno do tema carece de mais substância, de mais pesquisa de campo que possa esclarecer sobre os processos localmente em curso: como as populações locais estão vivenciando as iniciativas de manejo? O que, do ponto de vista delas, é positivo e o que não? O que pensam e querem? Os argumentos econômicos e ecológicos produzidos por técnicos e cientistas são, claro, parte importante do debate, mas há uma carência das argumentações nativas, digamos assim.

Enfim, naquela noite, muito modestamente, estivemos todos ali – alunos, professores e outros – ouvindo e aprendendo com palestrantes envolvidos mais ou menos diretamente na consolidação dessas experiências de reforma agrária diferenciada. Juntos exploramos as condições necessárias para o seu sucesso. Não todas, mas algumas, como o papel do Estado, os constrangimentos da lei, a questão tecnológica e da cadeia produtiva dos produtos florestais, a insegurança fundiária, a fiscalização ambiental. Não chegamos a conclusões, mas pistas de investigação foram ali apontadas. É um tema envolvente, dramático e atual. Um campo de pesquisa fascinante, e de militância apaixonante. Traz alegrias e decepções (como tudo na vida). Pode dar vontade de correr, mas é um osso difícil de largar de roer!

6 comentários:

Paulo Patalano disse...

Oi Mariana!

Tropecei no seu blog e estou me deliciando com a leitura dos posts. Vânia e eu mandamos lembranças.

Paulo Patalano

Anônimo disse...

Gostei muito do seu blog, estarei colocando como refência no meu...boa sorte

Valden Rocha
www.hooabilis.blogspot.com

Anônimo disse...

pq vc nao posta un contato seu? gostaria de trocar figurinhas contigo... mas nao encontrei un email da mariana.

Aflora disse...

Oi, também, Noé. Valeu a visita! Volte sempre.

Aflora disse...

Paulo e Vania, quantas saudades!!! Que bom tê-los aqui, dá um sabor de mais perto um pouco.

Valden, não consigo localizar seu blog para conhecer; talvez algum erro de endereço?!

Um email de contato? Vamos trocando por aqui Emmanuel, não te parece simpático?

Anônimo disse...

Oi Marina,
meus parabens pelo seu blog, gostaria de saber de vc tem contato com os Kaxinuás, pois eles fizeram uma vivencia aqui no sul do Brasil/Florianópolis/SC, onde usaram a medicina do rapé e gostaria de saber se seria possivel conseguir uma quantidade do mesmo.

Desde ja, lhe agradeço a atenção.

Fraternalmente,

Carlos
Fpolis/SC
BRASIL