Domingo assisti a estréia da nova série dirigida por Washington Novaes (a quem admiro e leio sempre que posso) sobre o Parque Indígena do Xingu. A série, com o título de "Xingu. Terra Ameaçada" revisita os povos residentes do Parque 23 anos depois da filmagem de "Xingu. Terra Mágica". O capítulo de estréia foi uma reapresentação do Parque e seus moradores, e das mudanças havidas nestas mais de duas décadas.
Muitas mudanças, como não poderia deixar de ser. O que neste mundo atualmente não muda muito em pouco tempo? Difícil ter um canto, que era meio que o "paraíso" há um tempo atrás, ou "tão tradicional", e que hoje, quando a gente revê, dá um aperto no coração sem nem saber porquê direito. Não há ironia nessas palavras, e sim perplexidade. Como lidar com toda esta diferença. Algo é inegável: perdem-se coisas; mas o que se ganha?
Voltando ao Xingu, lá muitas coisas mudaram. Bom, as crianças de há 23 anos atrás são hoje pais e mães de família. Nas aldeias há novidades materiais: antenas parabólicas e as abomináveis televisões, poços artesianos, fontes públicas com torneiras (poupando as mulheres de irem longe buscar água em latas d´água - se eu fosse uma índia acho que ia gostar desta novidade, e ia ao rio para curtir o banho mesmo!), construções de alvenaria (ao lado daquelas malocas gigantescas), bicicletas e motos - veículos por excelência para circular entre as aldeias ou mesmo dentro delas. Nota-se ainda que as novas gerações estão aderindo à roupas (vestidos, bermudas). E visitantes! A cena do Kuarup mostrada impressionou pelo número deles, brasileiros e estrangeiros!
É verdade, os rituais e cerimônias não foram abandonados, e nestes a roupa (ou a falta dela) é de acordo com a tradição. As pinturas corporais - maravilhosas! - também estão lá. A língua não se perdeu, tampouco a cerâmica e outras artes. Iniciativas de resgate e fortalecimento cultural também existem no Xingu.
A situação é, portanto, toda muito interessante, ainda mais se expandimos um pouco a lente e enxergarmos o que tem em volta: um desmatamento alucinado, empreendimentos do agrobusiness, comprometimento das nascentes dos rios que correm para o Parque... um sufoco! Mas tem também os aliados, ONGs, movimentos sociais, ambientalistas e por aí vai.
Mas algo ficou me incomodando durante todo este primeiro espisódio. Havia algo meio em cima do muro: as mudanças são ruins, mas a cultura permanece. Não sei se em cima do muro, ou se uma oposição criada que é difícil de resolver. Então a conversa num quadro era "realmente as mudanças na aldeia são uma ameaça a cultura etc", e no quadro seguinte era "mas vejam os rituais permanecem etc". Como se a gente ficasse pulando ora num pé, ora noutro. Como resolver isso? Vamos ver como a série vai caminhar...
Este papo de mudança cultural e identidade étnica não se encerra aqui. Registro apenas que é prudente fugir das profecias e previsões sobre o destino inevitável dos povos indígenas em contato com a civilização branca ocidental. Tanta gente já se enganou nessas previsões, gente de porte e valor, como o saudoso Darcy Ribeiro, e mesmo o professor Roque Laraia, de quem eu li hoje um texto escrito nos anos 60 sobre os Suruí e outro, no século XXI, no site do ISA sobre o mesmo grupo. Nos anos 60, a situação dos Suruí era desoladora, e hoje a recuperação é notável. Meu pensamento divagou e comecei a pensar nos Kontanawa do rio Tejo... Bom, mas isso fica pra uma outra ocasião.
As fotos são do site: http://www.brasiloeste.com.br/galeria/xingu
Um comentário:
Querida mari, parabéns pelo seu blog!!!!
Eu tbm tenho um, mas quase não divulgo porque é mais de assistência aos alunos, mas com sua iniciativa até me motivei. Veja lá, http://casmerim.blogspot.com/, a última postagem é de maio...
Gostei demais das suas descrições e opiniões.
saudades!!!
bjins
débora
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