domingo, 31 de agosto de 2008

Chez Monet et chez moi

Domingo fizemos um bonito passeio. A chuva que abriu o dia não sustentou-se, e o sol dominou o céu - para nosso alívio e contentamento. Saímos cedo de casa em direção a Giverny, onde Claude Monet, no início do século XX, já um artista reconhecido, recolheu-se para viver e trabalhar. Fomos, portanto, à casa de Monet, com seus jardins, ninféias e atelier.

Não há muito o que dizer, a não ser que vale à pena conhecer. Há flores de tudo quanto é tipo e cores, e o jardin aquático é uma beleza, com pontes, chorões e ninféias. Saíram desses recantos a inspiração para as famosas e gigantescas telas de Monet. Vi delas no Musée Orangerie (já falei disso numa outra postagem) e no Musée Marmottan (que acho que comentei, não sei). De toda forma, são lindas e imperdíveis. Em Giverny está a fonte inspiradora, na tela o artista inspirado; ou, como nas fotos (retratos) de Richard Avedon que vi numa exposição aqui, o resultado artístico é aquilo que ocorre entre o pintor-fotógrafo e a paisagem-pessoa. [Avedon diz sobre os retratos de pessoas que fez aos montes sobre um fundo neutro: o retrato não é uma representação da pessoa (ou da realidade), mas antes o que subjetivamente ocorre, naquele momento mágico do "click", entre o fotografado e o fotógrafo. Talvez dê pra pensar assim também sobre Monet-ninféias, embora, não sei, talvez no caso da pintura a habilidade, o talento, o estilo do pintor tenham um outro tipo de presença que a de um fotógrafo]

Fazendo uma ponte entre esses universos (interiores e exteriores), ando eu mesma com uns pensamentos ainda não sistematizados, mas que têm a ver com minha visão sobre o mundo, sobre a Amazônia e sobre mim mesma. Hum, ficou meio complexo. De toda forma, pra começar com algumas imprecisões e deixá-las no ar, diria que esta viagem está me dando uma "dimensão de mundo" inesperada. No Acre, onde vivo, o mundo tem uma dimensão. Aqui, em Paris, onde estou temporariamente, tem outra.

As fronteiras do universo acreano, por exemplo, seriam as dadas pelas nossas discussões e idéias, pelo que nos toca, nos diz respeito e mobiliza - como o destino da floresta. Para mim, por exemplo, esta tem sido uma questão central nos últimos tempos e que mobiliza minhas emoções, forças e idéias; informa meu comportamento e valores, aquilo que importa, aquilo em que acredito, aquilo que devo e quero fazer. Mas para os franceses é diferente. Bom, é uma obviedade, pois para eles só poderia ser diferente. Quero, contudo, dizer que senti o choque da diferença. Toda a questão ambiental, digamos assim, se colocaria aqui noutros termos, ou de outra forma, dentro de um outro padrão de comportamento. O consumo seria um bom exemplo.
Fiquei abismada com a quantidade de embalagens que se leva para casa quando se vai a um supermercado - e, claro, com a quantidade de lixo que isso gera. Isto quer dizer que os franceses, ou mesmo os europeus, não estão nem aí para a Amazônia ou a conservação de ambientes naturais? Não, não quer dizer isto. Eles estão aí pra Amazônia sim, só que de uma outra forma, com outras visões e soluções para conter a destruição da floresta. Eles têm uma longa história de construção do que são hoje e de como vivem - e isso não é algo que se largue ou se troque facilmente. Toda a visão sobre a Amazônia vai quase inevitavelmente passar por este filtro; talvez nem mesmo haja uma "visão sobre a Amazônia". O nosso filtro é diferente. Como incorporar o fato de que a Amazônia não é só uma só, a nossa [e este "nossa", sei, não é unânime, mas é "nossa" esta falta de unanimidade]? Que ela é percebida de diferentes maneiras, a partir de diferentes e ativos pontos de vista?
Talvez eu esteja sendo por demais etnocêntrica, ou acreocêntrica, ou marianocêntrica. Talvez, bem possível. Mas talvez se trate de outra coisa: uma certa crise pessoal, uma desesperança ou incerteza sobre o que fazer.

sábado, 30 de agosto de 2008

Back to Paris

A coisa já tá com cara de últimos preparativos. Comprar a encomenda do Dande, dar um pulinho na Fnac, voltar ao Orsay, ligar pra Veronique, rever a Edilene, definir com o Fabio onde vamos afinal, admitir que o Louvre, I'm sorry, fica pra próxima... Menos de uma semana em Paris antes da volta pra casa. O intervalo na Holanda foi bem bom pra dar uma distanciada e mudar de ares, e eis que Paris ficou até mais levezinha... Esses últimos dias foram de passeios e providências. Aquele lugar que você não quer deixar de ir, aquele presente que vc quer comprar, aquele café para ir de novo. Mas vai ficar muita coisa de fora (inclusive, tá com cara, o Musée de l'Homme, Marcelo).

Neste ponto, o negócio aqui é meio infinito. Sempre haverá um lugar pra se ir, um museu pra visitar, um filme pra ver. Tem uma revista semanal de programação cultural, a Pariscope, por exemplo, que é uma loucura: você folheia aquilo e pensa que, de fato, as opções são infindáveis e que aqui é mesmo uma capital cultural. Filme pra todos os gostos e de todos os jeitos. Escolher chega a ser chato. Mesma coisa para música, teatro. Um dos programas que queria muito fazer era percorrer a Galeria da Evolução, no Jardin des Plantes. Bom, é interessante, embora não exatamente como eu pensava. Ver aquele bando de bichos do mundo inteiro empalhados chega a ser meio mórbido, mas também interessante ter a dimensão deles em relação à gente. As girafas são incrivelmente altas! De toda forma, fiz novos amigos...

Ontem à noite, na tentativa que fizemos de encontrar um restaurante com alguma vista para a Eiffell, bom, não conseguimos nada, todos lotados, tinha que ter ligado e feito reserva. Tudo bem, vimos a torre, toda azulada, estava bem bonitona, toda, toda. Voltamos para casa, um jantarzinho caseiro, minha preferência, diga-se de passagem. Foi bem agradável, conversamos (François, Verônica e eu) sobre Amazônia e música.

Passara a manhã - um dia esplendoroso, deve ser dito, como poucos neste verão - com a Edilene e sua família pra lá de adorável: Edu, o marido, Clara e João, filhos. Ficamos ali no Jardin du Tuleries e entorno (Carossel do Louvre e jardins), almoçamos também por lá. Foi bem gostoso. Papo bom, comida honesta e crianças alegres. Numa pracinha, que ficamos um tempo, João deu milhares de voltas correndo com o mapa do Louvre na mão dizendo que estava atrás de um tesouro. Depois cantou, fez performances, uma coisa! Clara, olhava aquele show todo desconfiada daquele sucesso do irmão. Não é muito fácil, por vezes, ter um irmão caçula que cativa todo mundo. Clara é doce e suave. Acho que isso é uma coisa das Claras e Claires, pelo menos as que eu conheço.

Já anoitecendo, pra ir na Fnac, andei um pedacinho da Champs-Elysée. Deus me defenda!

quarta-feira, 27 de agosto de 2008

Van Gogh e um pouquinho de Amsterdam

Ontem foi dia de passeio em Amsterdam. Um dia apenas, uma pena. Mas vamos ver o que dá pra fazer, convidou-me a Hilly. Ora, o Van Gogh Museum já estava no programa desde antes de sair de Paris. Quando fui ao Dorsay já ficara encantada com as telas que vi lá, as cores, as pinceladas, enchem o coração. [Aliás, acho que vou de novo ao Dorsay antes de ir embora de Paris para o Brasil]

O Van Gogh Museum tem o maior acervo de obras de Vincent Van Gogh no mundo, e uma coleção permanente belíssima (não pude fotografar, então o quadro acima é do acervo do Dorsay). O museu estava cheíssimo. Nesses últimos dias tinha esquecido que estamos em plena alta estação e que há turistas para todo lado; fiquei mais com minhas amigas, no curso de florais, na casa da Hilly. Pois bem, foi aquela coisa de ver os quadros em fila, andando devagar e com gente por todo lado. Bem diferente quando o entorno está menos povoado e você pode andar pra lá e pra cá, olhar de perto e de longe. Mas, enfim, tudo por Van Gogh!

Os quadros são lindos, lindos. Há coisas inacreditáveis, nem sei como descrever arte, já que não sou entendida, e ficar falando "lindo, lindo" não dá muito idéia. Digo apenas que é uma emoção. Ver as pinceladas características de Van Gogh, a mistura de cores, o brilho, a força das imagens. Poxa, adorei ter ido lá, e voltaria (voltarei quem sabe um dia) a ver a exposição feliz da vida.

A vida de Van Gogh é dramática. Toda a sua obra ele realizou em apenas 10 anos, dos 27 aos 37 anos, quando então se suicidou. Pois é. Pelo que pude entender, ele devia ser uma pessoa com fortes distúrbios psíquicos, ia da euforia à depressão. Durante os dez anos em que pintou e desenhou sem parar, não obteve o reconhecimento da crítica e do público. Vivia duro e seu irmão, Theo, que trabalhava no mercado de artes, o mantinha financeiramente. Isto, parece, era um peso para Van Gogh, esta dependência. Vicent, antes de morrer, passou por sanatórios e tratamentos. Por outro lado, fiquei pensando, é muito louco, pois é como se ao invés de uma pessoa - Vincent - tivéssemos duas - Vincent e Theo. Theo acolheu e sustentou o irmão, eram profundamente próximos e amigos, amantes e colecionadores de arte e, olha que louco, menos de um ano depois da morte de Vincent (1890), Theo morreu (1891). Vincent com 37 anos, Theo com 33 anos. Eram almas inseparavalmente ligadas. Depois da morte de Vincent, sua cunhada e depois viúva de Theo, Jo, dedicou-se a divulgar a obra do cunhado. Foi ela que organizou as cartas trocadas entre os irmãos e que foram depois publicadas. Vincent escrevia muito.

Enfim, saímos do museu espiritualmente nutridas e fomos alimentar a matéria gulosa com sanduíches, tortas, café e um suco de morango inacreditável. Morango, aqui na Europa, tem aquele gosto legítimo de morango! Sorvete de morango aqui não é que nem aquela coisa leitosa e aromatizada de morango que a Kibon e outros fazem. Vou sentir saudades dos morangos... Passeamos então por Amsterdam, por um pedacinho da cidade. Vejam esta foto abaixo e comprovem o que eu disse sobre todo mundo ter bicicleta. Isso é perto da estação central: um estacionamento de bicicletas onde seus donos as deixam e pegam o trem para trabalhar. Reparem que há bicicletas no primeiro plano, depois mais atrás e depois em cima, num "segundo andar". É verdade, estou obcecada com este assunto das bicicletas! Em Amsterdam há ainda os famosos e simpáticos canais, mas não deu tempo de passear neles, de barco. Pra finalizar o dia, antes de voltarmos para Den Haag, pude ainda provar tamaras frescas - uma delícia.

Agora, já estou de volta a Paris.

segunda-feira, 25 de agosto de 2008

Casa da Hilly

Chegamos na casa da Hilly, fora de Den Haag, as portas de uma florestinha, com uma vizinhança de casas pequenas e simpáticas. São pré-fabricadas, todas com seus pequenos e bonitos jardins. Interessante o lugar, e acolhedor - assim como a Hilly. Esta holandesa tem um pé na floresta, onde morou por vários anos. Ela fala, portanto, português, e tem uma alegria interior muito gostosa da gente compartilhar.

A Hilly é devota de Amma, uma santa indiana viva que tem como missão acolher com amor as pessoas do mundo e despertar nelas a presença de Deus, nelas mesmas e em tudo o mais. Ela abraça, a Amma. Sim, quando ela está em algum lugar, as pessoas vão vê-la para serem abraçadas por ela. E ela acolhe a todos - homens, mulheres, crianças, velhos, animais e plantas. As fotos são muito incríveis e comoventes. Amma tem um olhar de criança, cheio de esperança e inocência amorosa. Ela abraça e compreende o que cada um está precisando, e isto transparece nas fotos, na intenção que vemos em sua expressão ao acolher as pessoas. Nossa, fiquei muito comovida, é forte. E fiquei com uma grande e sincera vontade de conhecê-la e receber o seu abraço! Pois bem, ganhei um livro da Hilly, com fotos e orações. Fiquei muito feliz!

Como disse, aqui do lado da casa da Hilly tem uma floresta, uma área verde com pinheiros, carvalhos (que nunca tinha visto ao vivo, aqueles que dão aquela noz que o Tico e Teco comem) e uns campos de flores lilás que são muito bonitos de se ver. Fomos então - Hilly, Maria Alice e eu - passear na floresta de bicicleta. O sol até saiu para dar um brilho e calorizinho a mais ao nosso passeio.

Sim, porque aqui na Holanda está o maior frio, quer dizer, para os padrões brasileiros e acreanos. O povo aqui está feliz da vida, curtindo o tempo "fresco". Eles sofrem com muito calor, quer dizer, o que para eles é muito calor talvez para nós seja um dia gostoso. A metereologia, portanto, pode ser muito relativa, apesar de toda a sua cientificidade, já que o tempo não é só aqueles mapas que a gente vê no jornal e na TV, ele é o que a gente sente como frio ou quente, agradável ou insuportável. E aí entram mediações pessoais, culturais, fisiológicas e outras mais, já que um tempo ensolarado pode ser bom para fazer algo (ir a praia, por exemplo) mas ruim para outra coisa (como ficar em casa estudando). Engraçado é que sinto que estou sentindo menos frio; não sei, de alguma forma ganhei um pouco mais de suportabilidade ao frio e ele parece me incomodar menos. Será que quando chegar em casa vou sentir saudade do frio? Bem capaz...

Algo muito especial

Tive uma rara oportunidade nesta passagem pela Holanda. No fim-de-semana pude participar de uma vivência com os florais da Amazônia, aqui em Den Haag, onde ainda me encontro. Pra quem não conhece ou ouviu falar, os florais da Amazônia são um sistema de cura baseado em flores (nativas, de plantas domesticadas e não) da nossa amada região amazônica. É fruto de longa pesquisa que vem sendo realizada por Maria Alice Campos Freire e Isabel Barsé, e os florais e outros medicinas (garrafadas, tinturas, unguentos, banhos) pelo Centro Medicina da Floresta, que tem sede no Céu do Mapiá. Há um livro publicado por Maria Alice e Isabel sobre o tema, e em Rio Branco, na farmácia Vitória Régia, é possível ter contato com os florais.

A pergunta-chave, como explicou Maria Alice, não é “que doença você tem?”, e sim como ativar e municiar o seu sistema de saúde individual para que ele possa restabelecer o equilíbrio alterado e potencializar nosso desenvolvimento (físico, mental, emocional e espiritual). Pois bem, este fim-de-semana um grupo de cerca de 20 pessoas se reuniu para saber mais, dos florais e de si próprio. Foi muito linda a oportunidade, saudada por todos como mais do que bem-vinda.

Não é o caso de contar, pois foi uma vivência. Poderia falar da minha, mas foi, como de todos, muito pessoal. Então compartilho a felicidade de ter tido esta oportunidade em plena viagem de ferias. Afinal, ferias de si ninguém tira, mesmo que queira! Foi, portanto, uma grata surpresa este encontro comigo mesma aqui na Holanda, que já estão gravados (o encontro e o país) no meu coração. E também, claro, o encontro com gente com motivações similares (embora as diferenças culturais, de hemisfério e outras mais sejam significativas), e também com minhas queridas amigas Maria Alice e Hilly, de quem virei uma espécie de “mascote”. Elas têm cuidado de mim com muito carinho.
Como se diz, amigo é a melhor coisa que tem!

sexta-feira, 22 de agosto de 2008

As margens do Mar do Norte

Vim dar uma volta, agora mais perto do mar. Estou na Holanda. Cheguei ontem a Den Haag, que fica entre Roterdam e Amsterdam. É uma cidade relativamente grande, para os padrões holandeses, claro, e, também seguindo os mesmos padrões, com muita bicicleta.


É um transporte usual, de certa maneira como em Rio Branco, só que no nosso caso usa bicicleta quem não quer ou não tem grana para andar de ônibus e também não tem carro. Aqui, digamos, TODO MUNDO usa bicicleta, que dispõe de pista própria na rua, sinal próprio, regras de estacionamento etc.

Outra coisa daqui também é o bonde como transporte coletivo. É bem simpático. Então tem ônibus, tem trem para transporte inter-cidades, as bicicletas, os carros e os bondes com seus trilhos pela cidade. Ainda não andei num deles, mas parecem bem confortáveis.

Aqui vim encontrar pessoas amigas de longa data. Hilly, que mora aqui, e Maria Alice, como eu brasileira e amazônida. Um encontro inusitado, um encontro muito bacana. Com elas vim parar numa casa de pessoas que gostam de jardim e de pássaros, e portanto tenho convivido com flores e uma “papagaiazinha” (ela não fala, mas canta muito) muito engraçada, toda amarelinha e cor de laranja que vive voando por e para cima de nossas cabeças!


Hoje visitei o museu de arte da cidade (bonito, gostei) e fui ver o mar com Joanna, outra amiga que conheci no Brasil há alguns anos. Descobri que ela é uma “velha loba do mar”, velejadora apaixonada e, como ela mesmo esclareceu, profunda respeitadora de Yemanjá, a rainha das águas. As águas daqui chamam-se Mar do Norte. O dia estava frio, nublado e ventoso, e o mar, cinza e belo. Fui um passeio muito gostoso este, na areia, revendo o mar, conchas, sentindo o vento embaralhar os cabelos.

quarta-feira, 20 de agosto de 2008

Um pouco de história

"Au IIIe siècle avant Jésus-Christ, un peuple celte de pêcheurs et de marchands, les Parisis, s'installer sur une île de la Seine où il fonde sa capitale, Lutèce, village relié à la terre ferme par deux ponts de bois. (...) Engagés dans la conquête de la Gaule, Jules César et son armée répriment durement le soulèvement des Parisis alliés à Vercingétorix: Lutèce devient romaine et connaît des années de paix et de properités." (extraído do livro "Paris à la loupe. Du Moyen Âge à 1900", de Claire d'Harcourt, editoras Seuil/Le Funambule, 2002)

Paris, portanto, chamou-se no seu nascimento Lutèce, a Lutécia que lemos nos livros de aventura de Asterix, Obelix & Cia. Nos primórdios, então, um povo chamado "parisis" se instalou na hoje conhecida Île de la Cité, e a partir dali tudo começou. É uma história antiga, em especial para quem, no Brasil, está acostumado a uma antiguidade de 500 anos apenas (desconsiderando, claro, toda a antiguidade dos povos nativos). A fundação de Lutèce data de 300 anos antes de Cristo. Naqueles idos vemos Júlio César à frente de um império em expansão. Lutèce é atingida e anexada ao Império Romano. Os livros sobre a aldeia gaulesa de Asterix são justamente desta época: lá está Júlio César tentando conquistar toda a Gália, e lá está a aldeia chefiada por Abracurcix, que resiste bravamente com a ajuda de uma "poção mágica". Vejam que os parisis aliaram-se a um possível parente de Abracurcix chamado Vercingetorix...

Depois desta ocupação romana, que entrou em decadência já na era cristã, vieram os temíveis bárbaros - socorro! É famosa a tentativa de invasão de Paris (o nome Lutèce já fora substituído) pelos Hunos, chefiados por Átila, que chegaram até os portões mas não entraram, milagre que é atribuído a Sainte Geneviève, eleita padroeira da cidade. Houve ainda uma ocupação germana e depois uma normanda (os Vikings), que acabaram, estes últimos, ficando com uma parte do território, a Normandia, hoje francesa.

Muitos povos, portanto, passaram por aqui e constituíram o que hoje chamamos de França: romanos, "bárbaros", germanos, normandos. Adicione-se a esta mistura migrações italianas, polonesas, espanholas, portuguesas, africanas et tout le monde, et voilá: o francês! O atual presidente da França, Sarkozi, por exemplo, é filho de pai húngaro e mãe grega, e atualmente casado com uma italiana. Com tanta mistura, foi com agradável surpresa que, passeando de bicicleta na floresta de Saint-Germain-en-Laye (uma área de 3.500 ha), encontrei uma família nativa de extrativistas de amora!

Bom, Saint-Germain é uma outra história. É uma vila antiga também (tudo aqui é antigo), com cerca de dois mil anos de história...

terça-feira, 19 de agosto de 2008

Boa companhia

Ontem passei parte do dia numa muito boa companhia.

Fala sério, esta turma não é muito alto astral???

Fiquei com vontade de tê-los todos como meus amigos (e a verdade é que é uma amizade interior, então sem empecilhos externos), conviver com eles até sentir esta paz interior que possuem.

E tem uns e umas que são animados, dançam e se divertem com alegria...

Ah, o budismo...

Encontrei esta turma quando fui visitar o Guimet - musée national des arts asiatiques, perto do Trocadéro. É um museu cujo mentor foi Émile Guimet, um rico homem apreciador e fã da arte existente no vasto continente asiático. São cinco andares a percorrer, contando com o térreo. Fiquei nos dois primeiros, não deu tempo e também é muita coisa, gente! Fiquei bastante tempo no primeiro andar, onde está o sudeste asiático (Cambodja, Vietnam, Tailândia, Myanmar e Idonésia) e a Índia. Foi lá que tirei estas fotos, desses budas. Incrível a presença budista na Ásia, e conforme o país há mudanças na representação, nas vestimentas, mesmo na carinha do Buda. Mas há muita influência mútua também.

Mais duas coisas: uma é que olhando aquilo tudo a gente fica pensando que os colonizadores andavam pelos países-colonias rapinando muita coisa. Missões, expedições, doações, são estas as fontes do acervo do museu (que está todo identificado). Mas como era esta missão? Arqueológica, várias delas. Mas aí o que escavava trazia para o país do arqueólogo? Sei lá, deve ser algo assim. Claro que a gente vê lá e está super bem apresentado e zelado. Mas impacta, pois também está fora de contexto e muito longe de casa.

Por outro lado, as obras de arte mudam de lugar, e lá as peças estão expostas como arte - uma arte de cunho profundamente religioso. Fiquei lembrando do Quai Brainly, que já comentei aqui, onde o estatuto de "arte" para as peças não está claro. Mas, no caso da arte, há um mercado. Os quadros do Picasso, por exemplo, que estão nos Estados Unidos foram adquiridos, comprados, ou doados. E as peças que estão no Guimet, por exemplo? As artes não são todas iguais, ou não tem os mesmos estatutos artísticos, ou algumas são mais artes que outras, ou o quê(s)?

Enfim, pra finalizar a conversa conto que passei um tempo também na parte do Tibet, no andar de cima (que tem também o Paquistão, Afganistão, Nepal, China). Bom, pra quem não sabe o Dalai Lama está visitando a França. Tenho muita admiração por ele, fiquei lendo umas notícias no jornal, olhei no mapa os cantos onde ele está andando. Aí quando vi as coisas do Tibet fiquei um tempo apreciando e imaginando que seria muito legal se o Dalai Lama aparecesse ali para visitar o museu, já pensou? Esssas coisas que passam pela cabeça da gente. Aí foi engraçado que numa hora em que eu estava olhando uma pintura grande na qual estão ilustradas passagens importantes da vida do Buda, olhei para o lado e, nossa, que susto! Tinha um monge vestido como o Dalai Lama, aqueles panos vermelhos, laranjas, cabelo bem curto e óculos. Por um átimo de segundo passou pela minha cabeça "será?".

domingo, 17 de agosto de 2008

Turning point

Toda viagem tem um "turning point", um ponto de crise. Comigo, nas minhas viagens, tenho observado isso. Estes dias vivi esta "virada". Começou com um cansaço de Paris, com uma desmotivação para sair a visitar os lugares. Depois foi virando uma carência, uma falta de interação humana, social, mais precisamente de gente amiga. Ameaçou virar uma rejeição à cidade e um "fui, galera!". Não foi muito fácil, haja fôlego. Respira daqui, muda o pensamento dali, reza acolá, cantarola um pouco... Deu de ir passando. Aí, finalmente, reforços chegaram: François e Verônica, e os filhos Claire e Gabriel, meus anfitriãos e donos da casa onde estou, que estavam de férias no Brasil. Foi muito bom ver gente conhecida, falar a língua, interagir. Comecei a ficar mais feliz (havia começado a ficar triste).

Aí hoje fomos passear, em Versailles. Bom, Versailles é uma cidade de 200 mil habitantes, aqui perto de Saint Germain en Laye, onde estou. Mas, além disso, é onde estão os jardins e palácio mais conhecidos da história da monarquia francesa. O palácio, contou-me François, foi construído sob Luis XIV com o objetivo, entre outros, de reunir ali a nobreza proprietária do que se pretendia que fosse o território francês. Parece que naquela época a unificação da França não era uma coisa tão pacífica assim, os duques, barões e condes, com seus pequenos domínios territoriais, viviam ameçando separatismos e arroubos de autonomia em relação ao pretendido poder central do rei. Pois bem, aí o rei mandou construir um baita de um palácio pra caber todo mundo e também ter todo mundo ali pertinho, e cortar as asas dos mais afoitos. Viviam então todos ali num luxo que a gente nem imagina, imagino.

Foi ali ainda que, depois, veio a reinar seu bisneto Luis XVI, aquele que perdeu a cabeça na Revolução Francesa; e foi ali que viveu Maria Antonieta, nobre autríaca que casara justamente com Luis XVI (e personagem do filme "Maria Antonieta", de Sofia Coppola). Na propriedade de palácio tem até uma área que é conhecida como de domínio dela: um pequeno palácio com mimos e caprichos, como uma "fazenda" para ela brincar de camponesa... Deve ter sido bom, até o dia em que ela também perdeu a cabeça!

Pois bem, hoje o palácio e seus amplos e belos jardins, e fontes e lagos, são de visitação pública. Lugar agradável para ir. Chegamos meio tarde, então nem nos animamos a entrar no palácio, que eu já visitara quando estive a primeira vez aqui em Paris. Andamos pela área externa e jardins. Vimos o finalzinho das águas dos chafarizes - são vários - que no verão funcionam até as 17 horas com uma música de época ao fundo. Esta música ao fundo é meio brega, quer dizer, a ambientação fica meio brega, mas as fontes são lindas. E os jardins e flores também.Por sugestão do Gabriel e da Clara, alugamos um bote e fomos remar no lago-canal principal, um dos passeios possíveis lá. Há patos e cisnes que ficam ali por perto. O que parecia algo meio sem graça revelou-se a melhor parte do passeio. Fui super-divertido revezarmo-nos nos remos, cada um exibindo a sua destreza e "desastreza". Acima, Verônica mostrava firmeza sob os olhares entre confiantes e divertidos de François e Claire. Abaixo já foi a vez da Verônica se divertir na tentativa de dobradinha que fizemos Gabriel e eu - que até que não foi tão mal: ora, por diversos momentos o barco navegou em linha reta!

Foi muito gostoso, recomendo.

sexta-feira, 15 de agosto de 2008

Impressões da diversidade de Paris

Paris é uma cidade com contrastes.

O que primeiro me chamou atenção foi a diversidade de gente, diversidade étnica. Quando estive aqui, em 1990, não lembro disso como algo que me tenha me atraído.

Em Londres sim, lembro bem, fiquei totalmente fascinada pelo metro: o vagão, a cada estação, sofria uma transformação de composição étnica, étaria, sociocultural, que eu só podia pensar que alguém já teria tido a idéia de fazer um ensaio fotográfico sobre aquilo. Punks, senhoras idosas, negros, indianos, brancos e por aí vai conviviam naqueles vagões. Mas, de Paris, não guardei esta memória. Agora não. Como ando bastante de metro e trem (RER), o fluxo de pessoas e diversidades parece que fica mais evidente. Além disso, esses meios de transporte são populares (no sentido de que todo mundo usa), portanto uma bela vitrine da população parisiense.

Muitos negros, muitos. Gerações nascidas aqui, filhas ou netas de migrantes. Mas acho que tem migrantes também. Muito frequentemente você está no vagão e entra uma ou mais dessas rainhas africanas, com aqueles panos coloridos, amarrados no corpo e no cabelo, brincos, penteados, uma coisa! Dá vontade, sinceramente, de ir lá entrevistar, fotografar. Então tem este povo à caráter, digamos. E tem também os "à paisana", mas com um estilo próprio, em especial as mulheres, com seus penteados, tranças e adereços. Têm corpos diferentes também das francesas "tradicionais" (ou "originais", argh, não sei que termo usar!). Tem cada mulherão. Homens também, bonitos, de todo jeito. Não senti algo como um preconceito racial no ar, mas não sei como é ser um filho ou filha de migrantes já nascido(a) na França, quais as oportunidades, como é isso. Um senhor comentou comigo que estas pessoas não teriam o sentimento de nacionalidade francesa, principalmente aquelas que não tem muito estudo e não conseguem trabalhar. Não sei.

Outra turma que chama atenção aqui são os mulçumanos. Mulheres com a cabeça coberta à moda tradicional - há muitas! Vi uma só toda de preto e com a cabeça coberta - aliás, muito bonita. Este universo islâmico para mim é misterioso. Fui então no Instituto do Mundo Árabe, um baita prédio novo, com um sistema de iluminação todo diferente e engenhoso, às margens do Sena (rive gauche); fui lá atrás de informação. Saí de lá frustrada, devo confessar. Tem uma exposição permanente meio tipo história oficial, com tesouros arqueológicos que comprovam a antiguidade da cultura árabe e seus feitos magníficos (como de fato o são). Mas perguntas como: o que é o islamismo? Como surgiu? O que prega? Bom, entrei e saí da exposição com as mesmas dúvidas. Na livraria que tem lá comprei um livrinho básico sobre a história do islamismo.

Mas voltando ao metro, muitas vezes tive a impressão de que eu poderia estar com aquelas pessoas no Rio ou em São Paulo. Gente diversa, de posses econômicas também diversas. Sempre achei que ia chegar em Paris e as pessoas estariam todas vestidas de um mesmo jeito, ou com um mesmo estilo, aquela coisa parisiense, sei lá. "Que roupa que eu levo???" Imagem pré-concebida, induzida pela mídia, idéia boba, enfim. Que nada. Aqui tem de tudo, gente vestida de todo jeito. Desde aquelas deusas africanas que eu falei, as mulheres mulçumanas com seus panos, as parisienses brancas com suas sapatilhas (é o sapato da cidade, incrível!), mulheres e homens super bem vestidos, quer dizer, caríssimamente vestidos (um luxo!), e gente como a gente, vestida de todo jeito, com "roupa normal", jeans, camiseta. Então, tem hora que você pode estar em qualquer lugar que não necessariamente Paris. Isto debaixo da terra, porque quando você vem a superfície e vê a cidade, bem, aí você não tem dúvida que está em Paris.

Outra coisa que me chama atenção desde que cheguei: gente pedindo dinheiro. Muita gente pedindo dinheiro. A Edilene me disse que em Portugal e Espanha, onde esteve este ano, viu mais do que aqui. Aí em Rio Branco não estou acostumada com isso, é pouca gente que se encontra pedindo na rua; no Rio de Janeiro, bom, aí tem de todo jeito e em abundância. Mas aqui me surpreendi. Você encontra gente na rua, que se identifica como desempregado. Você está no metro e de repente entra alguém e começa a contar sua história e falar de sua situação; pode ser um homem ou mulher, que depois passa pelo vagão vendo se recebe alguma doação. Tem outros mais criativos.
Hoje, por exemplo, num vagão, havia três jovens com um sonzão daqueles portáteis tocando o maior som alto e eles dançavam e cantavam. Legal. Tem músicos (violinistas, flautistas, sanfoneiros) que entram no vagão e tocam - gosto desses, sempre dão um fundo musical agradável à viagem. Até teatro de bonecos tem!

Hoje vi uma situação triste: no metro, num canto, uma senhora cantava uma música na sua língua (Europa oriental, acho). Só. E aos pés dela um copinho para as pessoas fazerem suas contribuições. É, a exclusão globalizou, invade e transborda. E cada dá o seu jeito. A Edilene me contou que ficou chocada quando viu mulheres mulçumanas pedindo dinheiro numa postura que, a seu ver, era uma imitação de Nossa Senhora, um apelo ou manipulação da piedade cristã.

Mas um contraste ainda não encontrei em Paris: a feiura da cidade.

quinta-feira, 14 de agosto de 2008

De l'eau

Uma das primeiras coisas que me chamou atenção aqui foi a água. Sou uma bebedora inveterada de água. Então, uma das primeiras coisas que consumi aqui foi justamente água. No Brasil já haviam me prevenido: você pode beber água da torneira - nos restaurantes e cafés, inclusive, ela é servida, de graça - mas não é tão boa e tem calcário. Muito calcário. Não lembro exatamente por quê todo este calcário, mas o fato é que tem.

A esponja ou o pano de pia, por exemplo, depois que secam ficam durinhos; você molha, volta ao normal; secou, fica duro de novo. Pra lavar roupa, tem um produto que é para pôr junto na água justamente para combater os efeitos do calcário na roupa; há produtos de limpeza para retirar excessos de calcário que com o tempo ficam em locais como boxes de banho, pia do banheiro. Se você faz um chá com água da pia, ferve e tudo, mas depois que esfria, no dia seguinte, você vai olhar lá onde fez o chá e tem uma natinha esbranquiçada. Vai lavar o cabelo, bom, é claro que tem algum efeito. Não, o cabelo não fica esbranquiçado, mas não fica aquela coisa macia e natural, achei. Mas neste ponto não é muito diferente da água tratada da Saerb, por exemplo, de Rio Branco. Hoje tenho poço em casa, mas quando usava a água da Saerb para tomar banho, vivia insatisfeita com o jeito que ficava o meu cabelo.

Enfim, o melhor é beber água mineral comprada, engarrafada, como nós aí. Não vi aqui aqueles garrafões de água de 20 litros que a gente compra aí no Brasil. Há muitas marcas de água mineral, aí comecei uma pequena "pesquisa" depois que provei a primeira e achei o gosto muito ruim. Cada vez que vou comprar, experimento uma marca. Sinceramente, no geral, todas são ruins, quer dizer, o gosto é muito ruim. Pelo menos para o meu paladar. É um sabor de água com sabão, sei lá; é um gosto que não parece "natural", parece que colocaram alguma coisa na água, ou coletaram numa fonte de má qualidade. Gente, é ruim. Estou sendo enfática, mas é que tem delas que bebo um gole e penso "ai, que água ruim", não dá pra abstrair.

Essas são algumas das águas que andei experimentando. A "Evian" é um socorro; a "Volvic" achei menos piorzinha; essas daí de cima não salvou uma (a da direita, inclusive, tem a maior cara de embalagem de produto de limpeza); acima entrou uma contrabandeada gasosa, a "Pelegrino", que é boa, quer dizer, com gás pareceu-me mais palatável. Em geral elas custam menos de 1 euro. Teve uma outra que gostei, que é boa mesmo, gostosa, e que acabei não guardando a garrafa. Lembro que era cara (1 euro e tanto), comprei uma garrafa pequena para experimentar numa loja de produtos naturais, orgânicos, que aqui são carérrimos.

É duro, porque está seco o tempo, a pela resseca legal, e a gente sente sede. Vai beber água, hum, aquele gosto... Ai, que saudades da Ver'água e da MontMário!

terça-feira, 12 de agosto de 2008

Diversos & variedades

Após formalizar minha saída do curso de francês e assumir de vez as férias, fui "bater ponto" no Jardin du Luxembourg e alimentar a "criação". Vocês estão vendo este passarinho, coisa mais bonitinha, aí perto do meu pé? Pois é, você senta pra comer o seu lance e chega esta turminha pra ser alimentada também. Ficam por ali, atrás das migalhas que caem acidental ou propositalmente. Mas, atenção, isso pode atrair visitantes indesejados: pombos! Este grandão e peitudo afasta os amiguinhos simpáticos. Não gosto de pombos.

Ontem me conectei com a torcida do Flamengo, do Coríntias, do Palmeiras... Foi assim: estava já há dias querendo ir a Montmartre e lá visitar a igreja Sacre Couer, que fica num ponto alto da cidade e tem uma vista bonita. Pois é, cheguei lá e topei com esta turmona toda! Procurei abrigo dentro da igreja, e lá de fato é proibido falar alto e não são muitos os que se animam a sentar nos bancos e ficar lá em silêncio. Paraíso. Fiquei lá tomando um fôlego, e reparando na decoração da igreja, que data do século XIX, se não estou enganada. No altar, acima, tem um mural grande, com uma figura de Jesus de braços abertos e um olhar penetrante. É como um ressurgimento. Ao lado estão a Virgem Maria e um anjo, e vem em seguida bispos e cardeais, santos e santas, e, logo em seguida, intelectuais e compositores, índios e negros, camponeses. Sei lá, fiquei ali olhando aquilo tudo e neste dia tão paradoxal tive, por um lado, a certeza de que eu não sou católica; e, por outro, vendo as manifestações de fé ali dentro da igreja, de que cada um é o seu verdadeiro templo. É isso que permite, penso, por exemplo, ter um ato de devoção e fé perante uma estátua de Jesus, como eu mesma tive.

Ontem ainda, andando pelo centro, ali na altura da rue des Écoles, topei com esta rua, a rue Descartes, este filósofo do racionalismo francês (mas não só). Interessante este canto de Paris: tem a Sorbonne, que ocupa uma quadra inteira, toda imponente. Ao lado, o College de France, que você fica olhando e imaginando o que acontece e o que já aconteceu ali: seminários de Lévi-Strauss, Foucault e outros mitos modernos. Lévi-Strauss, inclusive, vivíssimo e às vésperas de completar 100 anos dia 28 de novembro (anotem na agenda!). Mas, enfim, neste entorno, como ia dizendo, tem outras coisas, além de livrarias. Espalhadas em diversos estabelecimentos, em ruas próximas, existem várias lojas da Vieux Campeur, uma super-loja de artigos de montanhismo, caminhada, camping e afins. É bem legal. Um pedaço da cidade temperado pela atividade intelectual e a físico-corporal.
Hoje reencontrei uma pessoa querida, a Edilene. Chegamos no Acre juntas, no mesmo ano de 1991 e na mesma Cruzeiro do Sul. Eu andando pela Reserva Extrativista do Alto Juruá e ela na Terra Indígena Katukina (atravessada hoje pela BR 364). Edilene, professora da UFPR, está aqui num pós-doutorado. Fomos juntas almoçar ali pelo centro de Paris (nas imediações do Boulevard Saint German). Depois, esticamos no Café Danton, tão fortemente recomendado pela Bia Saldanha. O café é simpático mesmo, fica em frente ao metro Odeon, num ponto bem movimentado. Ficamos ali batendo papo, falando da vida e de pessoas queridas, como o Mauro Almeida (que saudades!). Acre-Paris, o mundo, afinal, não é tão grande assim, as distâncias, no tempo e no espaço, são percorridas mais rápido do que a gente pensa. Bom mesmo é viver!

Pra finalizar, uma imagem de um dos pontos de "vélolib" aqui de Paris, este perto do Centre Georges Pompidou. Pois é, hoje arrisquei-me em mais um tour de bicicleta pela cidade, saindo do Marais até o Beaubourg. Desta vez já foi mais legal, já me sinto mais à vontade na cidade, um pouquinho mais familiarizada, menos intimidada pelo francês, e, na biclicleta, fiquei, por exemplo, curtindo aquela coisa de quase parar sem colocar os pés no chão, desviando dos pedestres...

Ainda me animei a ir, desta vez de ônibus, até o Café Angelina, que fica na rue de Rivoli, em frente ao Jardin des Tulleries. É um café que data de 1903, diz a lenda que até o Proust já andou lá. Fui experimentar uma especialidade da casa, um chocolate quente chamado "Africaine". Uma delícia! Vem numa jarrinha que dá para duas xícaras e custa 7 euros. Mas nem pense em repartir; você vai querer repetir!

segunda-feira, 11 de agosto de 2008

Quente, polêmico e necessário

Abro espaço aqui nas postagens parisienses para um comunicado importante, na verdade, o lançamento de um livro do qual tomei conhecimento aqui. Trata-se de um novo empreendimento da Bia Labate, acompanhada de outros ilustres estudiosos de substâncias psicoativas.

Pra quem acompanha a trajetória da Bia, este acho já é o quinto livro que ela lança; destes, três foram em parceria com outros co-organizadores/autores, e um é de autoria dela mesma, sua dissertação de mestrado. Infelizmente não tenho o nome certo de todos os livros aqui, e vou citar de memória. O primeiro, de 2002 (e segunda edição em 2004), organizado junto com o Wladimir Araújo, é um clássico (no qual tenho um artigo publicado em parceria com Osmildo Kuntanawa): "O uso ritual da ayahuasca". Depois veio "A reinvenção do uso da ayahuasca nos centros urbanos" (de autoria da Bia). Algum tempo depois, "O uso ritual das plantas de poder", organizado junto com a Sandra Goulart. Depois um "balanço bibliográfico" sobre religiões ayahuasqueiras, com a Isabel Santana de Rose (a Bel) e o Rafael Guimarães dos Santos. E, finalmente, chegamos a este, que acaba de ser lançado:

"Drogas e cultura: novas perspectivas" (organizado pela Bia, Sandra, Maurício Fiore, Edward MacRae e Henrique Carneiro), tem orelha do antropólogo e especialista em segurança pública Luis Eduardo Soares (aquele que denunciou a "banda podre" da polícia carioca e foi defenestrado do cargo que então ocupava na Secretaria de Segurança Pública), e ainda uma apresentação de autoria do ex e do atual ministro da Cultura, respectivamente Gilberto Gil e Juca Ferreira. Não li o livro, claro. O tema é quente, polêmico e necessário. Então, estou certa, o livro é bem-vindo. Li e gostei especialmente da orelha do livro, do Luis Eduardo Soares, e reproduzo aqui um trecho que nos sintoniza de uma maneira muito positiva com o tema e a coragem da iniciativa que resultou no livro recém-lançado.

"Os ensaios aqui reunidos nos ensinam que as drogas, as dinâmicas de sua produção e os circuitos de sua circulação semântica, conceitual-científica, econômica, social, religiosa, política, estética, psicológica, ideológica e simbólica constituem fenômenos complexos, multidimensionais, que exigem abordagens transdisciplinares. Em uma palavra, as drogas não existem; são invenções datadas, cujos significados variam conforme os contextos culturais, seus repertórios específicos, seus vocabulários particulares. Drogas são ministradas por médicos ou xamãs; são objeto de fruição individual ou coletiva; servem para excluir, excomungar, reprimir, prender ou violentar os que as consomem ou os que não as consomem, conforme o caso; são sacralizadas em rituais místicos; são institucionalizadas em celebrações familiares e sociais; são objeto de consumo; têm valor comercial; são alvo de legislações; saberes; terapias. Elas são criadas por dispositivos prático-discursivos, historicamente constituídos, os quais acionam regras morais, categorias de acusação, exercícios de poder, estratégias econômicas, padrões de fruição, linguagens que organizam a consciência e a sensibilidade, orientações valorativas e experiências de sociabilidade.

Abrindo-se a esta quase ilimitada pluralidade de apropriações, as drogas carregam consigo um potencial extraordinariamente rico para quem se disponha a pensar as sociedades. Talvez por essa razão represente risco, perigo, ameaça e incerteza. Fonte de prazer e de morte, as drogas nos interpelam e, pela mediação do presente livro, exigem que as incluamos no centro de nossa agenda política e intelectual."

domingo, 10 de agosto de 2008

Ou isto ou aquilo

Cecília Meireles (com foto d'O Pensador, de Rodin)

Ou se tem chuva e não se tem sol,
ou se tem sol e não se tem chuva!

Ou se calça a luva e não se põe o anel,
ou se põe o anel e não se calça a luva!

Quem sobe nos ares não fica no chão,
quem fica no chão não sobe nos ares.

É uma grande pena que não se possa estar ao mesmo tempo nos dois lugares!

Ou guardo o dinheiro e não compro o doce,
ou compro o doce e gasto o dinheiro.

Ou isto ou aquilo: ou isto ou aquilo... e vivo escolhendo o dia inteiro!

Não sei se brinco, não sei se estudo,
se saio correndo ou fico tranqüilo.

Mas não consegui entender ainda qual é melhor: se é isto ou aquilo.

* * *
Pós-escrito por mim mesma:

Ou passeio ou estudo
ou acordo cedo ou durmo mais um pouco

Ou corro ou ando devagar
ou relaxo ou tensiono

Realmente, sempre há escolhas
Mas, feita a escolha, chega de pensar

O melhor é o que se escolhe!

sábado, 9 de agosto de 2008

Viva o aniversariante!

Estêvão, mon cher,

Hoje é você quem aniversaria. Parabéns pela chegada aos 40, onde, dizem, e com razão, que a vida começa, ou melhor, uma outra e significativa fase tem início. Entre outras delícias, nossa maturidade é posta à prova, vejo hoje. Tenho certeza que você está feliz com a data e a meta atingida, e olhando para o futuro com esperança, como sempre devemos estar. Sinto só estarmos tão pouco perto um do outro, digo fisicamente mesmo, na convivência. Veja só hoje: você aí, no Rio, e eu aqui, em Paris; nos últimos tempos tem sido no Acre. Ainda teremos este tempo - o da convivência mais estreita.

Enquanto isso, festejo aqui de longe com você sua data natalícia, e te conto um pouco o meu dia. Um singelo presente meu pra você.

Pela manhã, digo, já meio-dia pra tarde, acabei passando pelo Arch de Triomphe, e dali desci um pouco pela avenida Champs-Elysée. Bom, na verdade fui parar ali por acaso, e só por este acaso é que acho que fui parar ali. Quer dizer, não me passava pela cabeça ir passear nesta avenida, embora ela seja tão famosa. Estava cheia de gente, de lojas de griffe e também de contrastes (que comento em data menos especial).
Depois, passeei pelos canais parisienses, mais especificamente pelo San Martin e a Bassin de la Villette. Os dois tem seus cais, e no segundo fui pelo lado que se chama Promenade Signoret Montande. É a praia de Paris! Cheia de atrativos, inclusive uma areia meio pedregosinha numa parte do caminho, onde tem cadeiras espreguiçadeiras com listras coloridas, mesinhas e cadeiras de metal coloridas, uma espécie de chuveiro que solta vapor d'água (parece uma maresia de água doce e fresquinha) para quem quiser se refrescar, brinquedos para criança, lugares para comer e por aí vai. Muito legal, muito mesmo, esses equipamentos públicos de lazer, que todo mundo usa, sem precisar levar o seu de casa. Já imaginou ir para o Jardin du Luxembourg com a sua cadeira de baixo do braço?
Cheguei num tablado destinado a dançar: lá estava um senhor com um instrumento musical de mil novecentos e antigamente, uma pianola, digamos, daquelas nas quais você enfia a partitura que está codificada em folhas de papel furadas, e aí gira uma manivela e o som sai. Muito legal. Lembrou-me de cara o som do realejo, só que mais sofisticado (tocava até "La vie en rose"). Fiquei ali um tempo, lanchando e curtindo as pessoas cantando e dançando em volta.

Ao final do dia fui ao Musée du Quai Brainly, lembra, que você me falou. Um museu novo, para quem não sabe, inaugurado em 2006. O prédio é todo modernoso e o jardim, achei engraçado, parece um "matagal". Explico-me: há espécies diversas, mas entre elas uma espécie de mato. Você lembra daqueles terrenos baldios da Ilha do Governador, daquele mato que tinha? Pois é, achei parecido. Dá só uma olhada:

O Quai Brainly ("là où dialoguent les cultures") é um museu etnográfico com uma coleção permanente IMENSA. Visitei só um pedacinho, o destinado a sociedades da Oceania. Bom, vou falar um pouco do museu. Não tem mais foto porque lá dentro não pode fotografar. Ele tem uma divisão preliminar por grandes regiões do mundo: Oceania, África, América e Ásia. Aí, nestas grandes regiões, tem ainda um critério geográfico operando, ou seja, cada uma destas grandes regiões, no caso a Oceania (que visitei), é subdividida em regiões menores (mas grandes ainda), como a Nova Guiné, a Autrália, a Nova Zelândia, as Ilhas Marquesas etc. Combinado a esta subdivisão regional, vem uma que é temática. No caso da Oceania: objetos ornamentais e rituais (de iniciação, funerários, mágicos), adereços e jóias, máscaras, instrumentos (musicais, de trabalho, domésticos), motivos de pinturas corporais, entre outros.
Minhas primeiras impressões são duas. A primeira de que a divisão, o critério de exposição das peças, é passível de discussão. Por exemplo: eles pegam o leste da Nova Guiné e o tema dos ritos funerários, aí põem num mesmo espaço de exposição objetos utilizados em algumas das sociedades naquela região viventes. Aproxima-se coisas pela finalidade dos objetos, um pequeno texto tenta construir uma unidade também pelo significado, mas, não sei, a onde se quer chegar com este tipo de classificação? Em antropologia tudo isso dá pano para manga. Claro que alguma unidade regional é possível ser encontrada, afinal aquelas sociedades são vizinhas e trocam há muito, mas dá uma certa aflição ver aquela peça tirada do seu contexto societário e aproximada de outras igualmente "descontextualizadas" porque servem a mesma função.
Esta observação levou-me a segunda: chegou uma hora que simplesmente parei de ficar lendo aqueles textinhos e me detive nas peças mesmo; parei de ficar tentando compreender algo que não ia encontrar ali, de ficar aflita com aquela reunião de coisas "diferentes", e me deixei envolver pelas peças, pela sua beleza. São MARAVILHOSAS! Como será que esta coleção de objetos foi reunida? Coisa incrível. São esculturas gigantescas e belas, peças artesanais finíssimas, só vendo. Cada vez ficava mais deslumbrada, e aí me peguei dizendo "esses caras são uns artistas". Isso! Comecei a ver a exposição como de obras de arte. Aí fiquei me perguntando sobre as relações que existem entre o que é chamado de "arte", "artesanato", "objetos rituais". Há uma estética ali operando, isto é fora de dúvida, e houve artistas-artesãos profissionais que trabalharam naquelas peças. O que distingue o artefato, o artesanato, da obra de arte? Não será o Quai du Brainly também um museu de arte, e não tanto de objetos que servem para isso ou aquilo? Não será a arte o espaço de diálogo das culturas?
Fiquei pensando nisso tudo. Vou voltar lá. Quem sabe quando ver a parte da América do Sul, que me é mais familiar, possa entender melhor a proposta do museu e ter novas idéias sobre, afinal, o que é ou não arte. O que você acha?
Beijos, fica com Deus, e boas comemorações, Mariana
PS: desculpa aí, que este editor do blog não está aceitando os parágrafos que eu fiz no texto original e tá colocando tudo emendado...

quinta-feira, 7 de agosto de 2008

Je suis fatiguée

Nossa, hoje eu estou cansada. Queria que já fosse sexta-feira. Pois é... Sabe o que é? O curso de francês começou: todo dia das 8 da manhã às duas da tarde, com uma hora de intervalo para um café ou um lanche. São quatro horas de gramática e afins, e uma hora de fonética (pronúncia). São boas as aulas, estou gostando. O negócio é que é todo dia, e "moro em Jaçanã" (favor pronunciar com sotaque francês!), saio de casa às 7 horas, acordo entre 5:30 e 6 horas - é que preciso de tempo de manhã, acordar e sair correndo não é comigo. Saio da aula e costumo ficar por Paris, ali pelo centro, Jardin du Luxembourg e proximidades, dando um tempo para almoçar, descansar e aí dar uma volta, conhecer algo. Acabo chegando em casa tipo 7 horas da noite, que aqui ainda é totalmente dia. Isso é muito louco, pois com o céu claro a última coisa que você pensa é em jantar e ir dormir! Resultado, começo a achar que é hora de dormir mais de 10 horas da noite, acabo deitando mais de 11, e durmo menos do que gostaria. Acumula isso na semana, dá o maior cansaço...

Esses dias fiquei pensando: pô, mas eu estou de férias! Tem alguma coisa errada, ou meio fora do lugar. Ainda não sei o que é. Este compromisso matinal infalível tá puxado. Mas, depois que eu chego, eu gosto, a aula é boa, eu gosto de estudar francês, é interessante, aquela coisa diferente, meio difícil, mas meio familiar, tem muita semelhança com o português. E é uma língua bonita. As duas professoras são boas profissionais, e os colegas de classe vou conhecendo aos poucos. Aí estamos nós (na foto acima), ou parte de nós, num café perto do local do curso, na hora do intervalo. Da esquerda para a direita estão representados o México, a Colômbia, o Brasil e a Jordânia.

Acho que vou ter que arrumar uma forma de conciliar as aulas, o horário solar francês, o meu ritmo biológico e as minhas férias - que estas eu não vou deixar em segundo plano! Hoje, por exemplo, aqui, agora, são quase 11 e meia da noite, cheguei tem uma hora da rua. E nem jantei ainda (e não vou jantar, a esta hora não dá). O negócio é que hoje eu saí do curso e resolvi ir estudar na biblioteca do Beaubourg (Centre Georges Pompidou), mas resolvi, antes, conhecer a coleção de arte moderna que tem no museu de lá, nos últimos andares, de onde tirei a foto a seguir.Fiquei horas no museu... E nem vi tudo, acho que visitei um terço. Nossa, muita coisa bonita e diversa. Lindo mesmo. Merece ser visitado. Vejam este Matisse abaixo, ao vivo é emocionante! Acaba que a gente fica até zonza.
Saí da exposição meio sem nem saber direito onde ir. Resolvi conhecer o último andar, seguindo mesmo um povo que estava indo neste rumo, peguei carona na corrente, digamos. Resultado: deparei-me com uma super-exposição chamada "Traces du Sacré", imensa e fascinante. Uma overdose de arte! Havia obras de Picasso, Matisse, Kupe, Klee, Kandinsky, Bill Viola, Nijinski (que desenhava!), Grodowski (filmagem de uma dramaturgia), Rudolf Steiner (escultura e desenho), Braque, Pollock, Artaud, Ginsberg, Victor Hugo, Munch e outros artistas. Uma diversidade de alto nível reunida, exposição bem montada, cheia de referências literárias interessantes - tudo conectado pela linha do sagrado, da constituição da arte moderna e do pensar do homem [mais o ocidental, embora havia outras referências também] sobre si mesmo, sua civilização e (não) relação com o transcendente. Queria ir embora e não conseguia. Não tirei nem foto, fiquei lá viajando.
Enfim, quando fui ver já eram mais de 9 horas da noite, lá fora uma turma de gente fazia uma manifestação pró-Tibet (o Dalai Lama está para chegar na França) e eu peguei foi o rumo de casa. Meus pés doendo de tanto que fiquei em pé. O que me salvou foram castanhas e frutas secas, que sempre levo comigo. Tô indo dormir agora, quase meia-noite. Acho que amanhã essa aula de francês vai dançar...

terça-feira, 5 de agosto de 2008

Astronauta parisiense

Hoje tive uma sensação nova. Aquela de quando você descola, desloca, decola. E começa a se sentir longe de tudo e entrando numa outra realidade, ou dimensão, ou espaço-tempo, ou onda mesmo. Não, não fiz uma viagem espacial ou astral, simplesmente estava andando na rua, passeando no Marais, e quando sentei na Place de Voges para descansar e curtir o final do dia, vi que algo estava mudando. Que o Brasil, o Acre, Rio Branco, minha vida tal como estou acostumada, tudo isso estava ficando longe, longe, distante - e Paris e a vida aqui estavam mais palpáveis, perto, embora bastante misteriosas. Foi muito agradável sentir isso. Sentir "férias" - aquela sensação que só chega de verdade, penso, quando você esquece até mesmo do que você faz para ganhar dinheiro; quando você vive temporariamente uma vida, sabendo que ela é temporária, mas pode não ser; sabendo que vai voltar uma hora pra casa, mas pode não voltar. "Sem lenço, sem documento", o vento no rosto, imagens que tragam a sensação de liberdade, leveza, um suspiro, um sorriso.

Lembrei dos astronautas. Não os de hoje, que, sem querer em absoluto desmerecer a experiência fantástica que deve ser ir navegar no espaço, vão para estações espaciais que, imagino, deve até ter internet e algum "msn". Pensei nos pioneiros, aquela galera das naves "pé-duro", mais experimentais. Esses primeiros astronautas viram a Terra de longe. Guardadas as devidas proporções, será que sentiram algo assim como eu, hoje? Tipo: longe de casa, com os pés fora da t(T)erra que estavam acostumados a pisar, e com um universo desconhecido para explorar? Tudo bem, eles não tinham mapas e guias como eu tenho, mas ter esses equipamentos não tira o prazer da exploração.

Enfim, acho que me senti uma astronauta em Paris. Uma astronauta gostando muito de estar longe de casa, de deixar para trás ao menos por um tempo aquele dia a dia dos compromissos, dos telefonemas (argh!), dos pepinos domésticos e profissionais, dos projetos e planejamentos, das provas e das notas. Olhei pela janela da minha nave e mal consegui distinguir essas coisas...

Au revoir!