sexta-feira, 30 de maio de 2014

VIVA A AGROECOLOGIA!

Mariana Ciavatta Pantoja

De Petrolina, avistando Juazeiro, separadas pelas verdes águas do rio São Francisco, o Velho Chico chamado!
Estive em Juazeiro, semi-árido baiano, fronteira com Petrolina e o também semi-árido pernambucano, tudo isso às margens do rio São Francisco - que tem as águas, não sabia, da cor verde claro! Fui participar do III Encontro Nacional de Agroecologia (ENA), que ocorreu entre os dias 16 e 19 de maio, nas instalações da Universidade Federal do Vale do São Francisco.

Mais de duas mil pessoas estiveram ali reunidas, metade delas mulheres e, do total, em torno de 70% de agricultores e agricultoras de diversos pontos do país, de norte a sul, de leste a oeste, de assentamentos do MST, de quilombos, reservas extrativistas, terras indígenas, comunidades de colonos do sul, agricultores periurbanos e urbanos (não conhecia a "agricultura urbana"), do semi-árido nordestino, caiçaras, gerazeiros e tantos outros grupos que tem nas práticas agrícolas familiares e de base agroecológica um importante componente da sua identidade, territorialidade e modo de vida.

"Agricultura de base agroecológica". Esta expresssão era muito ouvida. Leiga nesta temática técnica, fui aprendendo ao ouvir, ver e também participar, o que pode ser esta tal de "agroecologia".

A primeira coisa que chamava atenção foi toda aquela grande movimentação de gente animada, de todas as idades, etnias, sotaques e modos, vindas de todo o Brasil, todos num clima de civilidade e gentileza recíprocas. Isto tornava de cara o evento bastante agradável e convidativo. A agroecologia teria a ver, conclui, com relações humanas mais humanas, digamos assim. A agroecologia é humanitária, quase franciscana, se me permitem: para todos sentirem-se bem e serem beneficiados, seres humanos e não humanos. A celebração final, nas margens do rio, louvando-o, foi um exemplo disso.

O III ENA foi encerrado com uma celebração místico-religiosa ecumênica às margens do rio, num belo entardecer...
Agroecologia também é algo imaterial: encantamento, espiritualidade, fé e força da natureza. Na tarde das "oficinas auto-gestionadas", uma das atividades do evento, por exemplo, ocorreu uma com a temática "Poesia popular e literatura de cordel", e que definia como seu objetivo sensibilizar os participantes para a "importância da poesia popular para o conhecimento agroecológico". Talvez, para os que dela tomaram parte, um dos momentos mais significativos do evento: ali ocorreram encontros de verdade, cantou-se, recitou-se poesias e cordéis, histórias foram contadas, lágrimas e risos. Ali a agroecologia virou cultura, e as fronteiras entre o simbólico e o natural mesclaram-se com muita arte. Como disse o artista Farinhada, usando uma imagem agrícola para falar da cultura: "a cultura, ela brota, onde tem gente ela vai brotar".

Coordenada por Caio Meneses (de frente, no centro da foto), do Centro Sabiá (PE), a oficina ocorreu na tarde do dia 18 e reuniu participantes de estados diversos, com formações também diversas, de artistas (como Farinhada, no canto direito da foto) à professores universitários, como a autora deste texto...
Agroecologia também é interface de conhecimentos, tradicionais e científicos. E também é interdisciplinar. Em todos os dias do evento, funcionou a Feira de Saberes e Sabores, com barracas de todos os estados e experiências, que ali apresentavam seus materiais (folders, vídeos, livros, cartilhas etc) e produtos agroecológicos, em geral comestíveis, mas não só. Havia também muito artesanato. E havia sementes e mudas para serem trocadas, bem ao gosto do conhecimento tradicional, que se reproduz na base da troca de ideias, experimentos, sementes e mudas, sem a mediação monetária. Aliás, o tema das sementes - símbolos da vida - esteve presente durante todo o evento em falas, discussões e ainda nas mandalas que, penduradas, enfeitavam a tenda principal do evento.

Na tenda principal, colorida e arejada, cabíamos todos e todas. Sobre as nossas cabeças, mandalas de sementes. Esta foto retrata um momento da plenária final, onde a carta do III ENA foi entregue e lida para as autoridades municipais, estaduais e federais presentes, entre elas o Ministro Gilberto Carvalho.
Contra os trangênicos, agrotóxicos e agronegócio, a agroecologia afirma e defende as sementes crioulas, os bioprodutos e biotecnologias adaptadas para e pela agricultura familiar. Entre os Seminários Temáticos que ocorreram, houve um bem interessante chamado "Sementes e Trangênicos" no qual a grande questão tratada era a autonomia das famílias de agricultores na produção de suas próprias sementes. Como produzí-las, acondicioná-las e fazer com que cheguem aos produtores, escapando da dependência das sementes compradas e/ou geneticamente modificadas? Quais as técnicas disponíveis e acessíveis? Como evitar a contaminação das sementes crioulas e a perda de diversidade genética e cultural? Fiquei sabendo que as sementes de hortaliças são um caso muito especial, em geral um gargalo para os produtores. Foi também apresentado neste Seminário o bem-sucedido caso da parceria da Embrapa com os Krahô, que recuperaram variedades tradicionais de milho recorrendo aos bancos de sementes mantidos pela primeira. Por outro lado, foi denunciado em mais de um momento do evento o boicote e perseguição que, dentro da própria instituição, sofrem os pesquisadores interessados em projetos e parcerias com agricultores tradicionais, e não em pesquisas de cunho empresarial.

Momento da passeata. Observe-se, além da jovem ao centro, a bandeira do MST e, à esquerda, dois índios com seus cocares.
 O ENA também foi marcado pela presença marcante das mulheres. "Sem feminismo não há agroecologia" foi talvez uma das palavras-de-ordem mais dita; as mulheres estavam todo momento no microfone, coordenando atividades e conduzindo a passeata do dia 18. Se são desse jeito as mulheres da agroecologia, os homens também têm que ser muito especiais! Essa vivência paritária, em ato, foi algo de que gostei bastante, e pareceu funcionar bastante bem.

Outro momento da passeata. Esta bolsa de pano, tipo mochila, e o chapéu de palha integravam os materiais distribuiídos aos inscritos no III ENA.
Outra coisa que funcionou muito bem foi a metodologia do evento. Desde as primeiras atividades, com as apresentações dos "territórios" onde foram realizadas as "caravanas agroecológicas" que prepararam o ENA, passando pelos "seminários temáticos" - tendo pelo meio a Feira de Saberes e Sabores e as "oficinas auto-gestionadas" - até chegar na "plenária final" podia-se perceber uma articulação entre todos os momentos. A conversa ia sendo sempre atualizada e enriquecida pelo que vinha das atividades precedentes, e a Carta do III ENA sem dúvida expressa o que foi durante o evento (e antes dele, nas caravanas) debatido.

Ainda com relação à metodologia, na sistematização das discussões dos "territórios" e dos "seminários temáticos", havia uma grande folha em branco e alguém com habilidades de desenhista ia ali registrando as conversas, reunindo desenhos e frases que representavam o que estava sendo tratado pelo coletivo. Ao final, um belo painel colorido, expressivo, cheio de símbolos, sintetizando o trabalho, estava ali, acessível a todos, tanto aqueles que vem da cultura escrita (como nós) quanto aqueles que têm mais dificuldade com ela. Descuidadamente não fotografei nenhum desses painéis, que eram transportados para a grande tenda e ficavam ali para todos e todas verem. Eficiência, beleza e democracia - isto também é agroecologia.

Pessoas, cores, músicas, chapéus, bandeiras, cartazes, bonecos gigantes, um belo e ventilado dia de sol marcaram a passeata.
Pra fechar, um pouco mais da passeata, que saiu da sede do evento e rumou para a ponte que liga Juazeiro e Petrolina, sobre o rio São Francisco. A ponte teve seu trânsito de carros, motos e ônibus fechada por quase uma hora, acho. E ali cantou-se muito, palavras-de-ordem foram bradadas, mártires lembrados, faixas penduradas sobre o rio. Quando o clima pareceu esquentar com os motoristas, o bom-humor e a organização dos manifestantes segurou a onda. 

Era bem jovem quando o Padre Josimo foi assassinado no Pará devido a lutas por terra. A Reforma Agrária era um lema forte no III ENA.
Ao final, a passeata rumou pra "casa", pro "planeta ENA", como apelidei intimamente toda aquela convivência no evento: um tempo e espaço diferenciados, com relações e trocas entre afins e, no horizonte, por que não, uma revolução agroecológica! "Cuidar da Terra, Alimentar a Saúde e Cultivar o Futuro" - este foi o mote oficial do III ENA.

Chico Mendes estava também presente no III ENA, como mostra a camiseta, e aquele xote muito conhecido por aqui: "não posso respirar, não posso mais nadar (?), a terra está morrendo, não dá mais pra plantar..."
A Carta do III ENA, entregue as autoridades na plenária final do dia 19, merece ser lida (leia aqui). Espelha as discussões realizadas, e toca nos pontos centrais para a construção de uma sociedade bem diferente da que temos aí e que nos é oferecida pelas forças hegemônicas. O III ENA foi, para ser clara, um momento político forte e importante, e a Carta final não alivia nada, não faz concessões, muito pelo contrário, trata do que deve ser tratado. Leiam.

sexta-feira, 15 de novembro de 2013

Cartografia de rede no Alto Juruá




14-01

No mês de outubro, entre os dias 19 e 21, o Laboratório de Antropologia e Florestas (Aflora)/Núcleo Acre do PNCSA realizou uma oficina de cartografia social com grupos que compõem, no Alto Juruá, uma rede de conhecimentos e conhecedores tradicionais. Trata-se de moradores da Reserva Extrativista do Alto Juruá que integram o Grupo Vida e Esperança e moradores de aldeias das etnias Kuntanawa, Ashaninka e Kaxinawá que vivem em de Terras Indígenas do entorno (localizadas nos rios Tejo, Breu e Amônia). A oficina reuniu cerca de 25 pessoas no Centro Yorenka Antame – Saberes da Floresta, localizado na sede do Município de Marechal Thaumaturgo, extremo oeste do Acre. O Centro é uma iniciativa da organização Apiwtxa, do povo Ashaninka do rio Amônia, criado em 2007 justamente para agregar e transmitir saberes e práticas das populações da floresta visando a disseminação de alternativas à tendência agropecuária de desenvolvimento e outras ameaças.

Leia a notícia completa aqui.

quarta-feira, 2 de outubro de 2013

Retiros e tiros no Araguaia: conflito em Luciara


Antonio João Castrillon Fernández 
Projeto Nova Cartografia Social da Amazônia

Ensina-se nas escolas, divulga-se na imprensa, diz-se nas conversas, que Mato Grosso é o produto bem ou mal sucedido de um longo processo de colonização. Ouvimos e lemos que, no período mais recente (segunda metade do século XX para aos dias atuais), empresas, famílias, bancos e tantas outras instituições subiram ao médio norte do estado, migraram do sul para o norte, para trazer o progresso, que é medido por tamanho de área cultivada, sacos colhidos, bois criados, potência de tratores e número de linhas das plantadeiras e colhedeiras. 

Essa história, por um lapso de memória, creio eu, pois ela não é mentirosa, assim dizem, esqueceu de dizer, de fazer ouvir, de escrever, de fazer ler, que este mesmo estado foi construído por outros processos de ocupação, que não ouso dizer colonização, pois não queria negar a história de outros, apenas fazer a sua própria. Ao longo do século XX, trabalhadores, famílias, grupos de famílias, comunidades, povos indígenas, por um caminho inverso, agora do norte para o sul, também migraram para Mato Grosso. Não trouxeram consigo bancos, escolas, instituições de pesquisa, não porque não queriam apenas por que não os tinham. Vieram ao encontro de novos territórios, de novas possibilidades, em que pudessem se estabelecer, produzir e garantir a vida de suas famílias. Chegaram primeiro. Estabeleceram-se. Produziram. Ensinaram. Formaram territórios. Criaram tradição – São Retireiros! São Povos Indígenas! São Quilombolas! São Ribeirinhos! São Extrativistas! São Camponeses! São Posseiros! São Tantos Outros que os nossos olhos, nossos ouvidos ainda não aprenderam a ver e ouvir. 

No decorrer dos anos 30 a 60 do século passado, parece distante, mas não passa de algumas gerações, o Vale do Rio Araguaia foi o destino escolhido por muitas famílias para se estabelecer, depois de perderem suas terras em situação de conflito. Saíram do Maranhão, Goiás, Ceará e de outras regiões, em longas jornadas, que poderiam durar meses ou anos, para ocupar os gerais dos varjões do Araguaia. Ao longo do rio grupos de famílias estabeleceram colocações; criaram seus filhos; plantaram roças; manejaram gado, utilizando as pastagens nativas; formaram comunidades e tocaram suas vidas. Acompanhando o ciclo da natureza, no inverno, movimentavam o rebanho bovino de baixo para cima, escapando das águas que subiam; no verão, desciam para os varjões, nos RETIROS, para alimentar o gado nas áreas de pastagens nativas verdejadas pelo recuo das águas. Essas famílias, que se autodenominam de retireiros, criaram uma tradição, por conhecimento vivido, acumulado, transmitido, de uso, de manejo e de apropriação dos recursos naturais. Distante de qualquer egoísmo compartilham de forma comum o uso da terra – trata-se de terras comunais.

Em tempos mais recentes, quando das famílias de retireiros e de suas comunidades já estabelecidas, chegam também na região os “fazendeiros”, “empresários”, grileiros, em busca de oportunidades e negócios, muitos deles estimulados e incentivados pelos programas de colonização e ocupação da Amazônia. Uma Amazônia fictícia que o Estado teimava em dizer estar vazia e desocupada. Para as comunidades que tradicionalmente ocupam esses territórios, como os RETIREIROS, foram e está sendo períodos de intensos conflitos territoriais. Ocupar a terra não bastava e ainda não basta para definir o seu domínio. Os “títulos”, muitos deles viciados e falsificados, eram suficientes, à vista do Estado, para anular as territorialidades e tomar as terras tradicionalmente ocupadas pelos retiros. Perguntam pelas suas escrituras e eles respondem, “são os ossos dos nossos ancestrais”. Dizem que não valem como documento.

No dia 19 de setembro, equipe do Projeto Nova Cartografia Social da Amazônia dirigiu para o município de Luciara com o objetivo de realizar Oficina de Mapas com a Associação dos Retireiros, que tem como presidente o Sr. Rubem Taverny Sales. No mesmo dia, por volta das nove horas da manhã, na estrada MT 100, que dá acesso ao município, um bloqueio coordenado, pelo que se houve dizer, pela associação dos produtores rurais de Luciara, impediu a entrada da equipe de pesquisadores no município e sob ameaças exigiu o seu retorno. Mas o pior estava por vir. Do dia 19 ao dia 22 de setembro a cidade ficou isolada, não é exagero dizer sitiada. Todas as entradas e saídas foram bloqueadas: estradas principal e secundárias, aeroporto e porto. Além disso, os comerciantes locais, solidários a tal manifestação, fecharam as portas dos seus estabelecimentos. Essa manifestação caracteriza-se como protesto de uma parte da população, estimulada especialmente por pessoas que possuem áreas ou documentos de áreas dentro
do território tradicionalmente ocupados pelos retireiros, contra a criação de uma Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS), conduzida desde 2006 pelo Icmbio.

O isolamento da cidade combinado com a ausência do poder público para reestabelecer o estado de direito favoreceu o desencadeamento de uma série atos de violência contra lideranças dos retireiros e daqueles que apóiam a luta deste grupo, principalmente do Sr. Rubem Sales e sua família; do José Raimundo Ribeiro da Silva (Zecão), diácono da prelazia; e, do vereador Jossinei, retireiro. A violência que atinge as pessoas pelo constrangimento, intimidação e destruição, visa também enfraquecer e desestruturar a identidade coletiva do grupo, que está fortemente ligada ao processo de territorialização específica das áreas de retiro.

Na noite do dia 18 de setembro, a casa do retiro do Rubem foi incendiada. No dia 19 a estrada bloqueada, impedindo a entrada e saída de pessoas. As pessoas e instituições que apoiam a luta dos retireiros foram coagidos, sob ameaças, a retornarem. No dia 21, atearam fogo em pneus em frente à residência do Rubem. No dia 22, a casa de retiro do Domingos, pai de Jossiney, vereador e retireiro, foi incendiada. A Lidiane, irmã do Rubem, recebe ameaça de ser queimada viva em cima da sua moto. Na madrugada do dia 23, dois disparos de arma de fogo foram deflagrados na porta da casa José Raimundo Ribeiro, diácono da Prelazia de São Félix do Araguaia e apoiador das lutas dos retireiros. Sucessivas manifestações (passeatas) passaram em frente à residência da família do Sr. Rubens com o objetivo de intimidá-la e coagi-la. Somente no domingo à tarde o bloqueio foi suspenso. A despeito de todas as denúncias e comunicados apresentados ao Estado nenhuma providência foi tomada no sentido de reestabelecer o estado de direito e garantir a integridade física e moral das pessoas que estavam sendo ameaçadas. Na terça-feira (24 de setembro) a Polícia Federal, por demanda do Ministério Público Federal, realizou a prisão temporária de algumas pessoas suspeitas e manteve um efetivo de policiais no município. Atitude que não equaciona a situação de conflito; mesmo com esta proteção temporária as lideranças ainda temem pela própria vida.

Rubem com sua família, Lidiane, Jossiney, Zeca, seu Domingos e tantos outros que sofrem com a violência praticada contra suas casas, suas vidas, suas histórias, suas ruas e seus territórios, não cometeram nenhum crime, apenas lutam pelos seus direitos, todos assegurados pela Constituição Federal, ratificados em acordos internacionais pelo governo brasileiro (Convenção 169), bem como estimulado por programas que visam garantir os direitos de povos e comunidades tradicionais (Decreto 6040 de 2007). Rubem é representante dos retireiros e povos do cerrado na Comissão Nacional de Povos e Comunidades Tradicionais, que tem por objetivo a efetivação do Decreto 6040. Essas pessoas apenas lutam pelos seus direitos. Sentem medo? Não sei, mas não enfraquecem. Juntamente com outras comunidades tradicionais e com os povos indígenas teimam em dizer que Mato Grosso é um estado de múltiplas identidades coletivas, é um estado pluriétnico e desenhado por diferentes processos de territorializações específicas. 

Cabe a nós reaprender a ver, a ouvir, a ensinar e a construir a nossa história. Podemos ser moderno, mas não somos contemporâneos. Ainda teimamos em deixar na escuridão todos aqueles e tudo aquilo que as luzes esconderam.

domingo, 15 de setembro de 2013

Culinária é vida!

No último dia 13, 6a feira passada, recebemos para uma conversa a professora e coodenadora da Organização dos Professores Indígenas do Acre (Opiac), Francisca Arara. Ela acaba de defender o seu TCC em Ciências da Natureza no curso de Formação Docente para Indígenas, na UFAC-Floresta, em Cruzeiro do Sul. Francisca, egressa do programa de formação da Comissão Pró-Índio do Acre, integra a primeira turma do curso, e seu trabalho foi orientado pela nossa colega Valquíria Garrote. Para um pequeno e atento público, Francisca contou do seu trabalho, que tem o título "A culinária Shawãdawa associada ao uso e ao manejo dos sistemas produtivos, da floresta e do rio".


O trabalho de Franscisa debate, por exemplo, com os dados oficiais que reportam a existência de "fome" e "desnutrição" em aldeias indígenas, elegendo-as como alvo de políticas assistenciais, tais como "sacolões". Francisca argumenta que a culinária tradicional shawãdawa sempre foi associada, pelos próprios índios, à fartura e riqueza. O "tempo antigo", como dizem, era o tempo da ausência de "preocupações", o território era como que infinito, vivia-se na abundância e sem angustiar-se com o dia de amanhã, ao contrário de hoje, quando o limite territorial é uma preocupação frente ao aumento da população e necessidades de uso dos recursos naturais. Por que não recuperar e por em prática o que a culinária e dieta shawãdawa já têm a oferecer como solução, em especial para a boa alimentação do povo?

O trabalho de Franscica é uma contribuição neste sentido, identificando e classificando os tipos de alimentos e seus locais de cultivo ou coleta, assim como seus modos de preparo. Mostra que, na verdade, estes recursos já estão presentes hoje na Terra Indígena, embora esquecidos ou abandonados pela influência de hábitos e alimentos externos e industrializados, como os que vêm nos sacolões: leite em pó, bolacha, óleo, açucar, feijão de fora da região etc. A segurança alimentar passaria então pela conscientização e reconhecimento da riqueza nutricional e cultural de que o povo shawãdawa já dispõe. Trata-se de uma ferramenta política, de autonomia, que já está ao alcance, independente de projetos e políticas assistenciais do governo.

A Terra Indígena Arara do Igarapé Humaitá, onde Francisca nasceu, se criou e trabalhou por oito anos como professora, tem 82.572 ha e fica no município de Porto Válter, no Alto Juruá acriano. O trabalho de Francisca enfocou uma das aldeias lá existentes, a da Foz do Nilo, onde vivem 30 famílias. Mesmo sendo uma membro do povo, Francisca cumpriu os ritos de pesquisadora, submetendo sua proposta de pesquisa à aprovação da comunidade e à assinatura de um Termo de Consentimento Livre, Prévio e Informado. Além da observação participante, Francisca lançou mão de diversos instrumentos de pesquisa, tais como visitas nas casas, em especial na hora das refeições, diários de alimentação, inventário dos plantios em hortas, roçados e sistemas agroflorestais, além de uma oficina culinária visando recuperar, e experimentar, pratos típicos da dieta shawãdawa.


Foi um prazer recebê-la, Francisca! Aguardamos a disponibilização do seu trabalho para poder então colaborar na sua divulgação.

sábado, 31 de agosto de 2013

A Ontologia Barrageira: Represas, Contingenciamento Orçamentário e Outros Cinismos

Por Juan Felipe Negret Scalia


Tanto faz represar um rio ou contingenciar o orçamento. Interrompe-se o fluxo contínuo, suprime-se a diversidade de imaginários, de representações e de valores-de-uso, aplica-se todo o poder institucional na literal canalização de certo potencial aos surdos e únicos propósitos que a própria ontologia consegue visualizar. Invisibilizam-se os demais mundos possíveis. Seca e contingenciamento a jusante, e alagação e acumulação a montante.
A ontologia barrageira, ou por tecnicamente dizer, ontologia do aproveitamento hidrelétrico atua por corte de fluxos. Atua por certa fractalidade: a partir da Casa Civil criam-se Pequenas Centrais Hidrelétricas operando contingenciamentos em todo Ministério e toda Autarquia por meio dos setores de contabilidade e finanças; e ainda mini-PCHs em todo o território nacional, em cada unidade descentralizada do Estado brasileiro, cada Superintendência, cada Delegacia ou Coordenação Regional. Todos obrigados a represar os fluxos das políticas públicas. Uma sutil linha de transmissão se encarrega da concentração fractalidade acima.
Administrar um país é igual a construir uma barragem. Estabelecem-se muralhas por Decreto: rio-acima da muralha a acumulação, rio-abaixo da escassez canalizada para a reprodução da própria obra. “Crescer o bolo para dividir”, dizia-se em campanha: o paradoxal aumento em números absolutos da renda da classe média, apesar do distanciamento em números relativos entre o mais rico e o mais pobre.
As eclusas se abrem para reprodução das mesmas obras, da própria ontologia: dos estádios de futebol, dos aeroportos, de mais eclusas. Mas são estas mesmas eclusas que se encarregam de enclausurar o próprio o Estado quando tenta chegar aos assentamentos de reforma agrária, às favelas, às aldeias e seringais: nem sequer apresentar-se nas paisagens da miséria quando a própria barragem inundou os agricultores, desalojou bairros pobres, indígenas, quilombolas; todos alagados-desterritorializados. “A idade do cinismo é a da acumulação do capital, porque é ele que precisa de tempo, precisamente para a conjunção de todos os fluxos descodificados e desterritorializados.”[1] 
Não se trata somente de ser contra a Usina de Belo Monte ou do Tapajós; nem tampouco de somente disputar o projeto político de país; trata-se de um deslocamento mais complexo ainda dos contornos ontológicos. Neste ano, governo comprou 1.591 motoniveladoras e 3.995 retroescavadeiras: “viram ‘souvenir’ de Dilma para prefeitos”, diz a manchete do Blog. 
A ontologia barrageira é incompatível com um dito Governo Popular. Um bom-governo só pode agir por dentro de uma ontologia dos rios livres, dos rios voadores!


[1] Deleuze e Guattari, . O Anti-Édipo.

sábado, 4 de maio de 2013

Encontro Amazônico de Saberes Consorciados Contra o Desmatamento

O Encontro foi uma experiência de cartografar e estimular consórcios de conhecimentos e conhecedores na região do Vale do Juruá acriano. (Foto: Enaiê Apel) 
Assim foi batizado o Encontro Regional do Acre que ocorreu entre os dias 20 e 22 de abril, na cidade de Cruzeiro do Sul, uma parceria entre o PNCSA, o Laboratório de Antropologia e Florestas (que, na UFAC, sedia o Núcleo Acre) e o Grupo Vida e Esperança, que atua na Reserva Extrativista do Alto Juruá. Mas não foi só um nome de batismo para o Encontro. Refletiu antes a intenção de avaliar as chances de um consórcio de conhecimentos para fazer frente ao padrão majoritário de desenvolvimento que avança sobre a Amazônia. Favorecido por políticas públicas e pela posição do país no mercado mundial de commodities, sua característica mais emblemática é o desmatamento. 

A idéia de “des-matamento” como um “des-conhecimento” foi explorada. Acima, Antonio Texeira da Costa, conhecido por Caxixa, líder do Grupo Vida e Esperança. (Foto: Enaiê Apel)

Para tal, estiveram presentes no Encontro 35 pessoas, entre pesquisadores da floresta e da academia. Da floresta vieram agentes agroflorestais, professores, artistas, inventores e agricultores, todos envolvidos em experiências autorais que apontam para alternativas de  vida e futuro na floresta, da floresta e para a floresta. Junto com antropólogos e biólogos, entre outras formações acadêmicas, procurou-se discutir a própria ideia de “conhecimentos tradicionais”, sua dimensão política como alternativa a processos de desmatamento e a proposta de uma rede que possa divulgar essas experiências e potencializar a atuação conjunta. 

Lideranças da Terra Indígena Kaxinawá do Humaitá, que realizam uma experiência de compartilhar seu território com índios “isolados”. (Foto: Enaiê Apel)

O Encontro propôs, portanto, um diálogo entre conhecimentos que têm vigência em diferentes espaços, obedecem a distintos pressupostos culturais e critérios de validade, e são produzidos em condições contrastantes entre si. Um, o dito tradicional, por meio do aprendizado cotidiano e direto, envolvendo muita troca e circulação livre de informação, e o outro, dito científico, requerendo salas de aula, muita leitura e escrita e uma apropriação privada do conhecimento produzido, cuja forma limite seriam as patentes. Por outro lado, ambos regimes de conhecimento requerem observação, experimentação e muita pesquisa, e neste sentido podem ser descritos como “científicos”.

Além de terminologia diferenciada, regimes de conhecimento são regidos por lógicas próprias. (Foto: Enaiê Apel)  

Realizar um diálogo mais simétrico e explorando possibilidades de tradução e composição foi um objetivo de fundo do evento, mesmo considerando todas as dificuldades que uma tal perspectiva enfrenta, em especial na universidade onde a ciência e suas verdades são produzidas.
 
Gerações, etnias e conhecedores: uma conversa que já tem história no Juruá. Na foto: Mauro Almeida (chapéu vermelho), da Unicamp, seu Milton (Kuntanawa, rio Tejo), Francisco (Arara, rio Cruzeiro do Vale) e seu Antonio de Paula (seringueiro veterano). (Foto: Enaiê Apel)

Para desenhar o que foi pensando como uma cartografia de rede e de conhecimentos, os grupos presentes foram convidados a apresentar suas experiências. Estas foram entendidas como os próprios conhecimentos que esses grupos detém e põem em ação. Por meio de desenhos, fotos, filmes e falas representantes do Grupo Vida e Esperança, dos povos Kuntanawa (do alto rio Tejo, dentro da Reserva Extrativista do Alto Juruá), Kaxináwa (dos rios Jordão, Breu e Humaitá), Ashaninka (do rio Breu) e ainda o sr. Manoel Bezerra, cientista nativo que trabalha com extração de óleos para fabricação de sabão e sabonete, expuseram suas atividades, pesquisas e métodos.

Membros do Grupo Vida e Esperança apresentam seu trabalho na Reserva Extrativista do Alto Juruá. (Foto: Enaiê Apel)

Falas lideradas por pesquisadores acadêmicos (Mariana Ciavatta Pantoja, sobre a associação entre conhecimentos tradicionais e a floresta; Alfredo Wagner, sobre a dimensão política dos conhecimentos tradicionais; e Mauro Almeida, sobre a ideia de rede) ocorreram nos diferentes dias do Encontro e visaram provocar reações e participação dos presentes.

Inversão dos papéis e posições costumazes no ambiente universitário convencional seria um pressupostos para a fundação de uma verdadeira “universidade da floresta”. (Foto: Enaiê Apel)

Se houve momentos em que se sentia a dificuldade pela qual uma tal conversa de saberes pode trafegar, houve outros em que as falas de sucederam, ou mesmo tomaram a palavra do “palestrante”, conduzindo o fio da conversa para um debate epistemológico. Na fala de Alfredo Wagner, por exemplo, a ideia academicamente tão falada de que conhecimentos tradicionais são um “campo de disputas” passou por diferentes entendimentos. A noção de que a tradicionalidade é uma “invenção” também enfrentou questionamentos.
 
Jucelino Rodrigues, o Peba, do Grupo Vida e Esperança, antigo monitor socioambiental e defensor da Reserva Extrativista como uma alternativa de vida. (Foto: Enaiê Apel)
Um outro retrato destas situações foi a espécie de subversão pela qual a mesa dos palestrantes sempre passou, com “a platéia” nela se instalando para fazer suas falas e a reconfigurando [a composição das mesas] seguidamente. Todos ali eram professores em suas diferentes áreas e campos de conhecimento. Interessante notar que, de alguma forma, isso se repetiu também no evento público na UFAC, no dia 22 à noite, no qual todas as perguntas da platéia foram direcionadas para os pesquisadores da floresta Antonio Caxixa e Ibã Huni Kuin, que imprimiram sua marca própria naquele espaço acadêmico (“mesa-redonda”), por exemplo levantando de seus lugares e se aproximando dos ouvintes para ouvir e responder perguntas dos alunos presentes.

Aluna da UFAC e o professor Antonio Caxixa. (Foto: Enaiê Apel)
Voltando ao Encontro, no dia 22, pela manhã, foi finalmente exposto no chão um mapa de 2 mts x 3 mts contendo informações hidrográficas e de regularização fundiária (Terras Indígenas e Unidades de Conservação), e no qual todos, sem sapatos, puderam, literalmente, sobre ele se debruçar e plotar suas localidades, experimentos e ameaças utilizando ícones-cores comuns. Um primeiro passo para o que pode vir a ser um mapa impresso de rede, espera-se, foi dado ali.
 
O trabalho sobre o mapa arrematou o esforço de cartografia de conhecimentos, experiências e ameaças realizado durante o Encontro. (Foto: Enaiê Apel)

Um espaço foi também reservado para que Alfredo Wagner, coordenador do PNCSA, expusesse para os presentes o projeto financiado pelo Fundo Amazônia que viabilizou não só o Encontro, como viabilizará alguns de seus desdobramentos ao longo deste ano e 2014. Dados sobre o orçamento total do projeto, itens financiados e valores, o custo do Encontro, entre outros, foram repassados aos presentes.

Ao final do evento, algumas diretrizes foram recolhidas no sentido de pautar as ações do PNCSA no Acre, mais propriamente no Vale do Juruá, região privilegiada pelo acúmulo de relações de pesquisa da equipe responsável e pela quantidade de áreas protegidas existentes, experiências em curso e pela notável sociodiversidade que a marca. Ficou claro que atividades que dessem continuidade a este primeiro Encontro – como oficinas, capacitação e divulgação – são necessárias, e enfatizou-se que elas deveriam agora passar para uma escala local e dar continuidade aos intercâmbios entre conhecimentos e conhecedores, expandindo a capacidade de mobilização da rede.

quinta-feira, 25 de abril de 2013

Carta aberta ao governador

Estes dias chegou na minha caixa de email uma carta ao governador do Acre, Tião Viana. Uma carta anônima. Anônima por medo das perseguições costumazes que, afirma o(a) autor(a) costumam sofrer os críticos do, já vai longe, governo "da floresta" e, hoje, "do povo" - continuamos insistindo nesta separação, e o campo da política pública é mestre nisto! 

Resolvi postar a carta aqui pois trata de relevante interesse nosso - humanos e não humanos: a distribuição de sementes trangênicas, da Monsanto, no nosso estado, a agricultores desejosos de viver da agricultura. Trata das nossas opções de desenvolvimento, do enaltecimento do agronegócio monocultor em detrimento de opções mais locais e inovadoras. É como diz a própria Vandana Shiva citada na carta: neste modelo de desenvolvimento, não há lugar para o pequeno.


CARTA ABERTA AO GOVERNADOR DO ACRE
SOBRE A LIBERAÇÃO DO MILHO TRANSGÊNICO
FACE À LEI ESTADUAL N. 1.534 DE 22 DE JANEIRO DE 2004

Rio Branco, AC, 19/04/13 (dia do índio, o maior agroecologista que conhecemos).

                        Senhor governador Tião Viana,

Venho por meio desta questionar vossa senhoria acerca da distribuição do milho transgênico "Yeldgard VT Pro2", criado e patenteado pela empresa Monsanto, e trazida ao Acre pela sua parceira Agroceres, uma vez que dispomos da Lei Estadual n. 1.534, de 22/01/2004, que "veda o cultivo, a manipulação, a importação, a industrialização e a comercialização de Organismos Geneticamente Modificados (OGMs) no Estado do Acre". Venho de forma anônima, temendo as costumases perseguições que sofre quem questiona o governo.

Senhor governador, a Lei n. 1.534 que o seu irmão, Jorge Viana, assinou, foi revogada?

Esta mesma lei diz que é "vedada a comercialização de produtos que, em sua composição, contenham substância proveniente de OGMs e que tenham como destino a alimentação humana ou animal". Mas hoje, nos supermercados, não encontramos nenhum cuscuz (nosso pão-de-milho) nem munguzá que não seja transgênico!

E que fim levou o "CTEBio", criado na Lei n. 1.534, com diversos representantes da sociedade civil ? Ele foi criado? Funciona?

Estes dias mesmo, senhor governador, saíram mais notícias denunciando a empresa que talvez seja a mais criminosa do mundo, a Monsanto, pela epidemia de suicídios de agricultores endividados na Índia, escravizados pelos pacotes tecnológicos da empresa ("As sementes de suicídio da Monsanto" http://racismoambiental.net.br, em 15/04/2013, escrita pela renomada cientista Vandana Shiva). Porque o seu governo decidiu fazer parceria justamente com esta empresa, tão criticada e processada no mundo inteiro?

 

Tempos atrás, senhor governador, foi publicado o importante estudo do Prof. G. Séralini, da Universidade de Caen, na França, demonstrando que o milho transgênico está causando diversos casos de câncer, e graves doenças do fígado, rins e mortes em ratos (ver em http://aspta.org.br/2012/09/o-fim-da-duvida/ e diversos outros sítios na internet). As fotos dos ratinhos cancerosos são alarmantes, em que os tumores têm tamanho de bolas de ping-pong. As pesquisas deste grupo são tão perseguidas pelas empresas que precisaram ser feitas em alto grau de sigilo.

 

Agrotóxicos e transgênicos são absolutamente prejudiciais à biodiversidade e à saúde humana, e são pacotes de grandes multinacionais e bancos de crédito que escravizam os produtores e, pior, os transgênicos exigem e fazem parte de um processo de crescente uso de agrotóxicos nas lavouras. "Coincidentemente", as mesmas empresas que produzem os agrotóxicos, produzem as sementes transgênicas vinculadas (resistentes) aos seus próprios agrotóxicos!

Em diversos países do mundo, boa parte dos agrotóxicos e todos os transgênicos são proibidos. O Brasil vem dando um péssimo contra-exemplo, servindo de verdadeiro lixão de despejo dos agrotóxicos mais perigosos que existem, sendo hoje o país de mais alto consumo destes venenos, que estão condenando populações inteiras ao câncer, como em Lucas do Rio Verde (MT), Unaí (MG) e cidades do Ceará. Tornando os brasileiros todos cobaias, num contexto em que a ANVISA é sumariamente impedida de trabalhar e o CTNBio é dominado pelas empresas, que, aliás, já as liberou de qualquer licenciamento ambiental ou monitoramento dos transgênicos no ambiente (http://aspta.org.br/campanha/boletim-536-11-de-novembro-de-2011/).

É incrível como os governos brasileiro e estaduais estão se aliando a estas megaempresas que ganham rios de dinheiro em cima de crimes ecológicos, sociais e de saúde pública.

Senhor governador, hoje já é de conhecimento de todos, com vasto material bibliográfico e na internet, as campanhas permanentes "contra os agrotóxicos e pela vida", "Brasil ecológico, livre de transgênicos e agrotóxicos" e semelhantes, lideradas por cientistas pesquisadores de renome, Fundação Oswaldo Cruz, organizações agroecológicas e de agricultores familiares, IDEC (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor), entre muitas outras.

Como é que o governo do Acre distribui sementes de milho transgênico gratuitas, via Secretaria de Agricultura e Pecuária, dizendo que isto é "desenvolvimento sustentável"? Pior é alardear em tons de lavagem cerebral que trata-se de uma "nova semente", com "inúmeras vantagens", tranzendo "tranquilidade" ao produtor, que afirma sorridente "este milho aceita bem o veneno contra pragas". (http://www.agencia.ac.gov.br/index.php/noticias/producao/17379-secretaria-de-agropecuaria-apresenta-novidade-para-plantio-de-milho-a-agricultores.html).

É, senhor governador, este milho de laboratório "aceita bem o veneno", mas e nós, e os seres vivos dos nossos ecossistemas, "aceitamos bem o veneno"? O senhor e seus filhos aceitam? Será que nossos filhos e netos, ou nós mesmos, não sofreremos com estes cânceres e doenças graves decorrentes deste e outros agrotóxicos e transgênicos?

As empresas estão deitando e rolando em cima do governo brasileiro desenvolvimentista e suicida. Cuidado, senhor governador, para não seguir cometendo este erro, e faça cumprir sua própria Lei n. 1.534 de 2004.

Queremos nosso pão-de-milho e munguzá naturais de novo, queremos não ter que morrer de medo ao nos alimentarmos todos os dias! O Acre tem natureza abundante, não precisa de agrotóxicos nem de transgênicos.